161: A política de saúde mental em discussão: lutas e experiências
Debatedor: A definir
Data: 02/06/2018    Local: FEFF Sala 03 - Tipiti    Horário: 08:30 - 10:30
ID Título do Trabalho/Autores
579 Prática em saúde mental: derruir dos muros ou colocação em outros muros?
Bruno Oliveira da Silva, Aline Silva Paura, Camylla Chagas de Faria, Joanna Vargas Barbosa Ferreira, Hannah Valéria Gomes Ramos, Dayana da Silva Drumond, Soraya da Conceição Telles Silva

Prática em saúde mental: derruir dos muros ou colocação em outros muros?

Autores: Bruno Oliveira da Silva, Aline Silva Paura, Camylla Chagas de Faria, Joanna Vargas Barbosa Ferreira, Hannah Valéria Gomes Ramos, Dayana da Silva Drumond, Soraya da Conceição Telles Silva

O presente estudo tem o objetivo de discutir o trabalho realizado em um hospital psiquiátrico situado na cidade do Rio de Janeiro, com foco especial nos encaminhamentos realizados para a rede de saúde mental, bem como o processo de desinstitucionalização. Através da prática cotidiana desenvolvida na instituição, nota-se uma burocratização nos processos de trabalho realizados com os equipamentos da rede, mais especificamente os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Dessa forma, busca-se problematizar o binômio desinstitucionalização/desospitalização, categorias amplamente difundidas no campo da saúde mental, e como tais práticas além de não incluírem outros serviços importantes nesse cuidado, também não estão em consonância com os princípios estabelecidos e defendidos pelo Movimento de Reforma Sanitária. Tendo como elemento central a discussão das práticas desenvolvidas nos diferentes serviços, verifica-se um latente processo de reinstitucionalização desses usuários através do que convencionamos chamar no âmbito da saúde mental de “capsicômio”. Ou seja, usuários são referenciados aos equipamentos da rede sob o viés da territorialidade, mas o que se observa é a permanência de práticas ‘institucionalizantes’ e cristalizadas que pouco contribuem para a autonomia desses sujeitos. Esse debate mostra-se importante pois outras formas de intervenções e cuidado poderão ser criadas ou repensadas, reorientando o foco do tradicional tratamento asilar ofertado a essa população para a promoção da cidadania e criação de uma nova consciência e cultura sobre a loucura, em consonância com as reais perspectivas da luta antimanicomial. Enfim, uma vez compreendido que a exclusão suprime a condição humana dos usuários da saúde mental a atuação das diferentes categorias profissionais será redirecionada para um trabalho em conformidade com os direitos fundamentais, a dignidade da pessoa humana e, finalmente, a reformulação do modelo de tratamento.

699 A lgumas possibilidades para Análise das Políticas para Atenção Integral aos Usuários de Álcool e Outras Drogas
Maria Alice Bastos Silva, Ana Lucia Abrahão da Silva, Ana Lucia Abrahão da Silva

A lgumas possibilidades para Análise das Políticas para Atenção Integral aos Usuários de Álcool e Outras Drogas

Autores: Maria Alice Bastos Silva, Ana Lucia Abrahão da Silva, Ana Lucia Abrahão da Silva

Objetivos: Este trabalho tem por objetivo compartilhar o processo de pesquisa da Análise Microvetorial da Política de Atenção Integral a usuários de álcool e outras drogas, CAAE: 64851417.8.0000.5243. A pesquisa em andamento faz parte do escopo da linha de investigação desenvolvida pelo “Observatório Microvetorial de Políticas Públicas em Saúde e Educação em Saúde”, localizado na Universidade Federal Fluminense, Niterói, Estado do Rio de Janeiro. O pesquisador responsável compõe o grupo do Núcleo de Pesquisa Gestão e Trabalho em Saúde (NUPGES) com ênfase na integração ensino e serviço. Também participa dos encontros do coletivo Micropolítica do Trabalho e o Cuidado em Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Este resumo visa trazer para cena as dificuldades e os desafios para escolha dos caminhos possíveis para análise de políticas. Desafio maior é optar por modos de fazer pesquisa em que os referenciais teóricos são fontes e modos de produção de conhecimento no campo do contra método. O que neste contexto se entende como modos de se realizar a análise sobre políticas utilizando caminhos menos, clássicos, partindo de outras perspectivas que implicam reconhecer as diferentes possibilidades sobre a construção de políticas, que não se limite por regras metodológicas obvia. Método:O contra método significa não estar limitado pelo modo cartesiano e racionalista da produção de conhecimento, consiste em tencionar a produção de verdades. Uma investigação que se imprime nas disputas, nos valores e nas forças que constituem a produção de políticas. Neste contexto algumas perguntas nos auxiliam nessa produção como, de onde vem o interesse por pesquisar a política? É necessário se reportar a Reforma Psiquiátrica (RF), nos últimos 26 anos, para responder esta questão. A RF como um movimento, se constituiu com diversas correntes que formaram este cenário, com algumas particularidades e que provocaram tensões entre si. A força desses movimentos, em pleno processo de democratização do Brasil no final de 80 e início de 90, teve como resposta a criação de instrumentos como: leis, portarias e regulamentações, criadas no campo da política pública, que passaram a ser material de analise no campo de produção do conhecimento. Oportuno lembrar que um dos objetivos que levaram à criação das políticas públicas a partir de 2001 foi dar forma ao campo da assistência para os usuários de álcool e outras drogas, respaldadas também nas diretrizes do Sistema Único de Saúde. A partir do levantamento sobre pesquisas no campo de álcool e outras drogas verifica-se que esses estudos reafirmam a relevância dessa pesquisa, pois é evidente a lacuna no campo do conhecimento a respeito das políticas e seus efeitos na produção de cuidado na atenção para usuários de álcool e outras drogas no SUS. Os estudos se limitam em apontar as possibilidades e fragilidades das políticas que reproduzem modelos de cuidado proibicionista e a exclusão social. Verifica-se a ausência de alternativas de cuidado que atinge de forma histórica e contínua aqueles que sofrem de transtornos mentais devidos o uso de álcool e outras drogas. Como aponta a literatura, existe uma demanda mundial com vasta discussão e produção de evidências científicas. Os estudos do Ministério da Saúde (MS) acrescentam informações, como: das dez doenças mais incapacitantes em todo o mundo, cinco são de origem psiquiátrica. No Brasil, o MS, a partir dessas evidências e, principalmente, na produção dos estudos no campo de álcool e drogas, destaca a necessidade de mais estudos que contribuam para transformação do processo de cuidado. Com a produção da genealogia na perspectiva da analise das políticas públicas, que não se restringe ao campo da saúde mental, se tem a expectativa de contribuir de forma diferenciada. A experiência no campo da atenção em saúde mental e o diálogo com estudiosos do campo das políticas públicas de saúde contribuem na delimitação do problema de pesquisa. Isto porque como profissional de saúde, com percurso no campo da assistência em saúde mental, desde 1993, percebe-se a importância da realização dessa pesquisa para prosseguir a formação e contribuir para o campo da produção de cuidado. Como se constituiu esta proposta dessa pesquisa? A pesquisa em andamento baseia-se na ideia que a política é um efeito de muitas negociações entre vários atores, no processo de constituição dos atos políticos, das normativas e das diretrizes. A implementação da política também produz efeitos e transformações nas experiências e no processo de cuidado. Como exemplo, nos centros de atenção psicossocial, que no dia a dia se verifica que os resultados estão distantes do que as políticas recomendam. O que sugere ter como uma das perspectivas as contribuições de Michel Foucault para se pensar os agentes no campo como sujeitos produtores de conhecimento implicados nas práticas sociais, na produção de subjetividade no processo de cuidado, na utilização da ciência política no processo de controle e produção de governamentalidade. Como também, optar pela análise microvetorial como instrumento metodológico para produção de conhecimento processando fontes como as leis, utilizando a genealogia  e tendo o entendimento que é na micropolítica, nos diferentes cenários que se produz política, nas relações entre os diferentes atores, no processo de cuidado. Considerações:Deste modo, o que se torna um estranhamento, a produção de exclusão, provoca determinação em analisar o processo de constituição das políticas, a implementação e os efeitos das mesmas. Em um primeiro momento iniciou-se o mapeamento dos atos normativos e análise dos dados, leis, portarias, decretos e diretrizes do campo de álcool e outras drogas, no intervalo de tempo entre 2000 a 2015, tendo por base o diário oficial e relatórios do ministério da saúde. Nesse caminhar a sombra da genealogia percebeu-se que se trata de construir uma perspectiva abrindo mão de uma estrutura linear da historia e a origem do processo. Para isto, foi necessário ampliar o campo da pesquisa, dos atos normativos para a produção discursiva de diferentes atores que processaram a constituição dos atos normativos e as forças que se reafirmam de diferentes modos sobre estes atores. Nessa perspectiva o pesquisador, durante o mapeamento, é levado a participar de espaços de conversas, atividades cujo o tema álcool e outras drogas sejam as pautas e as políticas pertinentes as discussões. A partir desse primeiro mapeamento esta sendo proposto  algumas entrevistas abertas, individuais com gestores que atuaram na constituição e na implementação das políticas. O diário de campo está sendo um importante instrumento de registro do mapeamento dos atos normativos entre outros documentos como as narrativas produzidas a partir das entrevistas. Espera-se captar o agir e intencionalidade dos atores quando se movem no jogo social, na produção subjetivas e na produção de cuidado através da constituição das políticas públicas e estas como efeito em diferentes perspectivas. A análise do material produzido e registrado no diário de campo será posteriormente categorizada e fonte para a produção de analisadores. Finalmente será produzida uma narrativa final que irá formar  uma “colcha de retalho”, e junto ao referencial teórico constituir a narrativa do pesquisador na conclusão da pesquisa. Na realidade pretende-se criar conexões e produzir novos interesses na produção de conhecimento. Entende-se a mesma como um movimento de permanente construção de subjetividades e que impulsiona a escolha de ser um pesquisador, mas também um profissional da saúde.

996 Grupo Condutor da RAPS da Baixada Litôranea : O que os Gestores têm a falar sobre a Rede de Atenção Psicossocial?
Rosemary Calazans Cypriano, Maria Paula Cerqueira Gomes, Leiliana Maria Rodrigues dos Santos

Grupo Condutor da RAPS da Baixada Litôranea : O que os Gestores têm a falar sobre a Rede de Atenção Psicossocial?

Autores: Rosemary Calazans Cypriano, Maria Paula Cerqueira Gomes, Leiliana Maria Rodrigues dos Santos

APRESENTAÇÃO: Estudar e pensar sobre a prática dos gestores municipais de saúde mental por meio do que eles têm a dizer sobre suas dificuldades para implantação das ações da RAPS, é a  pesquisa que está em andamento e sobre a qual tenho me debruçado durante o Mestrado Profissional em Atenção Psicossocial do Instituto de Psiquiatria da UFRJ no IPUB. Questionar o próprio Grupo Condutor da RAPS da Baixada Litorânea como dispositivo de gestão e pensar sobre a possibilidade desse Grupo ser uma ferramenta de Gestão Estratégica para o Planejamento Estratégico Regional da Rede de Atenção Psicossocial tem sido uma das direções na realização dessa pequisa. Objetivos da pesquisa: Tendo como objetivo geral nesse estudo, identificar por meio das narrativas produzidas pelos gestores quais são as dificuldades encontradas para implantação das ações que compõem a RAPS da Baixada Litorânea, e como objetivos específicos identificar as contradições e os impasses que a Rede de Atenção Psicossocial da Baixada Litorânea enfrenta, construindo a partir da produção das narrativas, o que vivem e pensam sobre essas ações, esse coletivo que compõe esse dispositivo de gestão. DESENVOLVIMENTO: Método do estudo: Dessa forma, para atingir os objetivos propostos nesse estudo, vem sendo utilizada a Metodologia Qualitativa e por meio de narrativas são utilizados os Métodos de Análise de Ricoeur, assim como o da Observação Participante. A forma de coleta de dados iniciada através de Oficinas de Identificação de Problemas que estão sendo realizadas com os gestores municipais de saúde mental, traz um roteiro oculto de perguntas que trabalha os impasses encontrados por esses gestores. RESULTADOS: Os resultados dessa pesquisa estão contribuindo para o enfrentamento dos desafios da Reforma Psiquiátrica, vividos em especial pelos gestores de saúde mental na Baixada Litorânea; e traz como resultados parciais a possibilidade de tornar o Grupo Condutor da RAPS/BL mais potente na realização das ações pactuadas pelos gestores municipais de saúde, além de contribuir não somente para a Gestão Regional da Rede de Atenção Psicossocial como também fazer dessa pesquisa um instrumento de intervenção para a Gestão Estadual. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Essa região possui apenas um CAPSi e apesar de ser composta por nove municípios sendo eles: Araruama, Armação dos Búzios, Arraial do Cabo, Cabo Frio, Casemiro de Abreu, Iguaba Grande, Rio das Ostras, São Pedro da Aldeia e Saquarema, apenas um dos seis municípios que possuem Hospital Geral, possui leitos de saúde mental Credenciados e Habilitados pela Portaria 148 GM de 31 de janeiro de 2012, porém sem a instalação do Serviço de Referência Hospitalar. Além disso, não possui nenhum CAPSIII, e como não é possível regular mais nenhuma vaga para internação psiquiátrica pelo SUS na região, torna-se grande a importância da ampliação da Rede de Cuidados Territoriais que permita garantir a todos os cidadãos o direito à saúde.

2557 Reflexos da Precarização do da Rede de Saúde Mental Sobre a Consolidação do Projeto da Reforma Psiquiátrica
Ramon Reis dos Santos Ferreira, Camila Macedo Martins, Laiz Prestes Carneiro

Reflexos da Precarização do da Rede de Saúde Mental Sobre a Consolidação do Projeto da Reforma Psiquiátrica

Autores: Ramon Reis dos Santos Ferreira, Camila Macedo Martins, Laiz Prestes Carneiro

A Reforma Psiquiátrica Brasileira é um processo complexo que vinha conquistando espaço nos planos assistencial e ideológico, redirecionando o modelo da atenção em saúde mental no Brasil, sobretudo desde a aprovação da Lei 10.216, em 2001. A partir da experiência de três residentes psicólogos, alocados em um hospital psiquiátrico do Rio de Janeiro, observou-se a persistência de dois fenômenos compreendidos como potentes analisadores das dificuldades experimentadas na prática dos serviços de atenção em saúde mental atualmente: a produção de novas internações de longa permanência e o fenômeno da porta giratória ou “revolving door”. Elencou-se, então, dois casos clínicos de forma a ilustrar os fatores indissociáveis determinantes desses processos: a precarização da rede assistencial, a disputa ideológica entre distintos modelos de cuidado e as dificuldades da prática e da formação. A produção desses movimentos, que vão na contra-mão das diretrizes da reforma psiquiátrica, contribui para um discurso sobre a necessidade da existência de hospitais psiquiátricos - dispositivos localizados, ainda nos dias atuais, de forma contraditória no escopo da RAPS. Percebe-se que o cenário contemporâneo de progressivo desmonte das redes públicas de saúde está intimamente relacionado a uma direção política que reforça outras respostas de cuidado no campo da saúde mental. Faz-se necessária, ainda, uma análise da repercussão dessas novas diretrizes de cuidado que vem sendo implementadas pela atual política de saúde mental. Neste sentido, propomos nos aprofundar na discussão sobre os impactos da fragilidade da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) na elaboração e sustentação de Projetos Terapêuticos Singulares (PTS) dedicados a manutenção do cuidado dos usuários em serviços de saúde mental no território. 

2981 Genealogia da Lei 10.216 e a Política de Saúde Mental
Flavia Helena Miranda de Araújo Freire, Rafael Mendonça Dias, Paula Marques Klier Monteiro

Genealogia da Lei 10.216 e a Política de Saúde Mental

Autores: Flavia Helena Miranda de Araújo Freire, Rafael Mendonça Dias, Paula Marques Klier Monteiro

A reforma psiquiátrica brasileira, inspirada na psiquiatria democrática italiana, tem início no final dos anos 70, sendo protagonizada pelo movimento dos trabalhadores de saúde mental. Pautada em reivindicações de melhoria nas condições de trabalho e denúncias de mortes e maus tratos dos pacientes internados em hospitais psiquiátricos, este movimento, oriundo dos trabalhadores, centra-se na dimensão técnico-assistencial, defendendo duas propostas iniciais: Inversão da política nacional de saúde mental de caráter privatizante para estatizante; e Implantação de alternativas extra-hospitalares que significassem a inversão do modelo assistencial em saúde mental, ou seja, a transformação do modelo hospitalar para um modelo de assistência ambulatorial, bem como a transição de uma lógica curativa para um foco na prevenção e promoção no âmbito da saúde mental. Nesse período, a assistência em psiquiatria se apresentava eminentemente hospitalocêntrica de caráter privatizante, onde 96% dos recursos da política de saúde mental eram destinados ao custeio de leitos em hospitais psiquiátricos, em sua grande maioria privados, e apenas 4% destinava-se ao custeio da rede ambulatorial, de caráter público. O início dos anos 80, até meados dessa mesma década, acumulou debates e mobilizações protagonizados pelos trabalhadores de saúde mental. A ampliação desse movimento de reforma ganhou envergadura de movimento social, em Bauru-SP, no ano de 1987, em meio ao II Congresso Nacional dos Trabalhadores de Saúde Mental, que culminou com a criação do Movimento Nacional de Luta Antimanicomial. A luta passa a ser “por uma sociedade sem manicômios” encampada também pelos usuários, familiares e sociedade em geral. Após a criação do Movimento de Luta Antimanicomial, fortalecendo o processo de Reforma Psiquiátrica, inaugurou-se o período de criação de um aparato legislativo com a submissão do Projeto de Lei 3.657 de 1989, que passou 12 anos em tramitação sendo aprovado apenas em 2001 com a Lei 10.216. A denominada Lei da Reforma Psiquiátrica propõe a garantia dos direitos dos pacientes internados em instituições asilares, bem como aponta, ainda que timidamente, para a reversão do modelo de assistência em saúde mental de base territorial. O presente trabalho é fruto de pesquisa desenvolvida pelo Observatório de Políticas, Educação e Cuidado em Saúde Mental da Universidade Federal Fluminense campus Volta Redonda, e integrante do projeto nacional Observatório Microvetorial de Políticas Públicas em Saúde e Educação em Saúde, coordenado pela UFRJ em uma parceria interinstitucional com outras universidades. O objetivo desta pesquisa refere-se ao estudo genealógico da Lei 10.216, como marco legal da dimensão jurídico-política da reforma psiquiátrica e a constituição da política de saúde mental brasileira. Ancorado no referencial teórico de Nietzsche e Foucault, aproximamos da concepção de genealogia como método de investigação da pesquisa, em busca de compreender a origem do movimento social de luta antimanicomial e de reforma psiquiátrica, culminando com a construção de redes de cuidado e de política pública no campo da saúde mental. Ainda, partimos da análise microvetorial que busca captar a intencionalidade dos atores envolvidos, bem como os efeitos da lei operados na política de saúde mental. Nesse sentido, a pesquisa propõe: compreender e analisar os diferentes olhares sobre as proposições políticas emanadas do Poder Executivo, através de leis, normas, portarias para o campo da saúde mental, atentando para as disputas em jogo pelo modelo assistencial em saúde mental; avaliar os efeitos das proposições do marco legal nos aspectos micropolíticos e macropolíticos; analisar o processo de desinstitucionalização do aparato manicomial, atentando para a reversão do modelo assistencial; mapear a constituição da Rede de Atenção Psicossocial, bem como da Rede Intersetorial; analisar os aspectos da produção do cuidado aos usuários identificando a intencionalidade dos agentes quando se movem no jogo social desta produção. A pesquisa, que se encontra em fase de andamento, investiga tanto o cenário nacional de construção da Lei 10.216 e seus efeitos na política nacional de saúde mental, como também se debruça na genealogia da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) no município de Volta Redonda, a partir do mapeamento dos diversos serviços de saúde mental e da rede complementar intersetorial, que trabalham no acompanhamento das pessoas com transtornos mentais, investigando o desmonte do aparato manicomial do município e sua reorientação de modelo assistencial, a partir da construção de serviços substitutivos ao manicômio, e integrados em uma Rede de Atenção Psicossocial. A pesquisa está relacionada ao acompanhamento de decisões, leis, regulamentos e normas emanadas do Poder Executivo para o campo da saúde, considerando de forma central o que é proposto e os efeitos da sua aplicação na vida dos seus beneficiários - usuários. Esta referida lei é fruto de um intenso debate e luta advindo do processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil e do Movimento Nacional de Luta Antimanicomial. Sancionada no dia 6 de abril de 2001, após 12 anos de tramitação do projeto de Lei nº 3.657 de 1989, que dispunha sobre a “extinção progressiva dos manicômios e sua substituição por outros recursos assistenciais e regulamenta a internação compulsória”, a medida legislativa em Lei, resguarda o direito das pessoas com transtornos mentais, e aponta para o redirecionamento do modelo assistencial em saúde mental, priorizando o caráter de assistência extra-hospitalar de base territorial. Após um ano de sancionada a lei, foi publicada a Portaria 2.391 em 26 de dezembro de 2002, com o objetivo de “regulamentar o controle das internações psiquiátricas involuntárias (IPI) e voluntárias (IPV) e os procedimentos de notificação da Comunicação das IPI e IPV ao Ministério Público pelos estabelecimentos de saúde, integrantes ou não do SUS”. No decorrer dos anos 2000, foram inaugurados diversos serviços substitutivos em todo território brasileiro, com ênfase no CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) como serviço estratégico na política de saúde mental. Em 2011 o Ministério da Saúde regulamente os serviços de saúde mental articulados em rede, fortalecendo o caráter de regionalização e redes de atenção à saúde. O instrumento normativo dessa política é expresso pela Portaria nº 3.088 de 23 de dezembro de 2011, que “institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde”. Os dados preliminares da pesquisa aponta para análise da expansão e busca de consolidação da rede substitutiva em saúde mental. Como efeito da lei podemos observar o direcionamento da política, com incentivo e linhas de financiamento específica para a ampliação de CAPS em todo território nacional. O ano de 2005 apresenta-se como um marcador de reversão do modelo assistencial do ponto de vista do financiamento, onde o gasto extra-hospitalar supera o gasto com hospitais psiquiátricos. Outro dado que merece destaque e maior aprofundamento, diz respeito às brechas que a lei apresenta quanto à permissão de criação de leitos em hospitais psiquiátricos, além da inclusão de Comunidades Terapêuticas na Rede de Atenção Psicossocial. Em tempos de tamanha ameaça ao SUS, desmonte de estratégias na atenção básica, e ameaças de retrocessos na política de saúde mental e reforma psiquiátrica, almejamos que o Observatório de Políticas, Educação e Cuidado em Saúde Mental, com  os dados desse estudo, seja mais um dispositivo de investigação e pesquisa, que em produção com um corpo coletivo de pesquisadores, possa contribuir com a sustentação de uma política pública e de cuidado em saúde mental, cujos princípios antimanicomiais e de desinstitucionalização estejam no horizonte de sua defesa.

4340 Quando crescer é um desafio: a atuação da Coordenação Estadual da Rede de Atenção Psicossocial do Amazonas na preservação dos direitos do adolescente.
Luciana Diederich Nunes Pessôa, Helione Lima Pontes, Nayandra Stéphanie Souza Barbosa, Wylnara dos Santos Braga, Rosimary de Souza Lourenço, Ismael Italo Oliveira Reis

Quando crescer é um desafio: a atuação da Coordenação Estadual da Rede de Atenção Psicossocial do Amazonas na preservação dos direitos do adolescente.

Autores: Luciana Diederich Nunes Pessôa, Helione Lima Pontes, Nayandra Stéphanie Souza Barbosa, Wylnara dos Santos Braga, Rosimary de Souza Lourenço, Ismael Italo Oliveira Reis

Apresentação O presente relato de experiência tem como objetivo refletir sobre a articulação da Coordenação Estadual da Rede de Atenção Psicossocial do Amazonas (CRAPS-AM) com os demais pontos de cuidado, contando com a participação do movimento social, Fórum Amazonense de Saúde Mental (FASM) e a Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM), em prol da garantia dos direitos de uma adolescente vítima de abuso sexual na cidade de Manaus.A necessidade da articulação da rede, deu-se devido uma adolescente apresentar, no momento do atendimento no Serviço às Vítimas de Violência Sexual (SAVVIS), quadro de transtorno mental, o que poderia impactar na sua acolhida e no seu cuidado.  Para tanto, partimos do pressuposto de que o cuidado em saúde é o resultado de um trabalho coletivo, constituindo-se em uma ação multiprofissional em que cada profissional intervém com seu saber técnico. Assim, o cuidado em saúde mental, fundamentalmente requer essa ação multiprofissional e intersetorial. No entanto, este caso vem demonstrar uma gama de preconceitos e estigmas que envolve a Saúde Mental. Desenvolvimento do Trabalho Trazemos a baila o caso da jovem M.B.A.C, 16 anos de idade, a fim de compreendermos o cenário e a vulnerabilidade vivenciada por esta adolescente que teve seus direitos negados por diversos fatores, inclusive por apresentar suspeita de transtorno mental. No mês de julho do ano de 2017, a CRAPS- AM tomou conhecimento que havia uma adolescente internada no Centro Psiquiátrico Eduardo Ribeiro (CPER) desde maio do mesmo ano e que já se encontrava de alta médica, porém não efetivada. Diante do exposto, a equipe teve acesso ao seu prontuário, no qual consta registrado que a adolescente vivia com a mãe, supostamente acometida por transtorno mental, e o avô materno. No que tange à família, esta apresentava situação de vulnerabilidade social, resultando na permanência da M.B.A.C por longos períodos nas ruas, sendo mencionada também a ocorrência de possível prostituição e uso de drogas pela mesma. No mês de maio, a adolescente foi atendida pelo SAVVIS com suspeita de abuso sexual por parte de seu avô, apresentando quadro de infecções sexualmente transmissíveis e sintomas psicóticos. As alterações comportamentais motivaram o encaminhamento ao CPER, único serviço de pronto atendimento e de internação breve em psiquiatria no Amazonas. Ao longo desta internação foi constatado que a adolescente apresenta déficit cognitivo e comportamento infantilizado e que as alterações comportamentais que a levaram ao serviço psiquiátrico se tratavam de reações vivenciais do trauma experenciado, tendo períodos de internação que a adolescente não era submetida a tratamento medicamentoso, entretanto apresentava recaídas decorrentes de sua longa permanência em ambiente inóspito, característico de um regime manicomial. Diante disso, iniciou-se uma articulação intersetorial visando à proteção da adolescente face ao risco psicossocial por ela vivenciado. A Secretaria Estadual de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania (SEJUSC) sediou o primeiro encontro das instituições para a discussão do caso. Quando se contatou a juíza responsável pelo processo, tomamos conhecimento de que sua determinação era de acolhimento em unidade de saúde mental e não em um lar de acolhimento às crianças e adolescentes em risco social, existente na cidade de Manaus. Segundo a magistrada, a jovem M.B.A.C apresentava risco às demais adolescentes acolhidas no lar. Tal entendimento ocasionou descontentamento e discordância da RAPS por se tratar mais uma vez da reafirmação dos estigmas em saúde mental. Com o mesmo posicionamento da RAPS, a Defensoria Pública do Estado e o Fórum Amazonense de Saúde Mental agregaram forças para superar os estigmas e garantir os direitos da adolescente em questão. Resultados e/ou impactos Tendo em vista o panorama apresentado, ocorreram quatro reuniões intersetoriais para alinhar as ações emergenciais em prol da minimização dos riscos eminentes que ainda persistiam na vida da adolescente M.B.A.C. A partir destes encontros, decidiu-se pela institucionalização da adolescente em casa abrigo especializada, garantindo assim, a preservação de seus direitos e sua proteção social. Diante deste relato de experiência, compreendemos que para esta adolescente, estar acolhida e ter um lar significa ser olhada como pessoa, ter dignidade e ser cidadã. Não podemos negar que a adolescente M.B.A.C teve seus direitos negados em todos os âmbitos, por isso institucionalizá-la em um lugar que acolhe adolescentes em risco seria minimizar as consequências desse processo de exclusão e  lhe garantir o mínimo de cuidado e proteção.  Contudo, para que tais direitos fossem garantidos, foi necessário um agir coletivo destas instituições, possibilitando que houvesse de fato um olhar subjetivo, que considerasse a pessoa e não a doença simplesmente. Considerações Finais A luta anti-manicomial no Brasil teve início na década de 70 e seu marco legislativo ocorreu no ano de 2001, com a homologação da Lei Federal nº 10.216 de 2001. Esta lei apresenta um novo modelo de cuidado em saúde mental, a qual visa substituir a lógica do isolamento por um novo olhar baseado em um cuidado comunitário e territorial. Entretanto, a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) do Amazonas caminha a passos lentos na Reforma Psiquiátrica Brasileira. Apesar dos avanços significativos, o Amazonas ainda apresenta uma quantidade insuficiente de pontos de atenção à saúde mental, de maneira que há que se avançar ainda mais pela oferta e qualidade do cuidado em saúde mental. Além disso, casos como este refletem os estigmas da loucura presentes no seio societário, que perpetuam à máxima do isolamento social aos que por algum motivo “destoaram” dos padrões de “normalidade”. Uma vez em acompanhamento de saúde mental, a pessoa é exposta a rótulos de periculosidade que a dificultam ter uma convivência social saudável. O direito à cidadania, em todos os seus aspectos requer uma luta coletiva permanente. Este caso nos revela que o caminho é longo. Nessa situação foi possível fazer a articulação da rede de atenção com vistas ao entendimento e resolutividade requerida, entretanto há situações que precisam de intervenção e resolutividade em curto período de tempo e que, portanto, independem de aceitação. Nesse sentido, precisamos ter como aliados os defensores dos direitos humanos, para fazer valer o que atualmente se preconiza na Política Nacional de Saúde Mental, a garantia da cidadania aos que por muitas décadas tiveram suas histórias de vida ignoradas, furtadas e/ou negadas.  

5106 INTERFACES ENTRE A POLÍTICA DE SAÚDE MENTAL E JUVENTUDE
Luana Pereira Pereira do Nascimento Lima

INTERFACES ENTRE A POLÍTICA DE SAÚDE MENTAL E JUVENTUDE

Autores: Luana Pereira Pereira do Nascimento Lima

O trabalho que ora é desenvolvido versa suscitar questionamentos quanto à política de saúde mental no Brasil atentando para as relações do uso de substâncias psicoativas (SPA) e juventude. Perfazendo a gama dos direitos sociais no âmbito da política de saúde o Movimento de Reforma Psiquiátrica, iniciada no final de 1970, período de redemocratização no Brasil aponta inquietações no horizonte da necessidade do cuidado em liberdade. Nesse interim novas formas de intervenções do Estado brasileiro emanam, influenciada pelas novas configurações sociais e históricas. Foi apenas no início dos anos 1990 que algumas iniciativas forjaram um olhar ampliado para a situação de saúde dos usuários de SPA, como exemplo, podemos citar algumas estratégias de Redução de Danos que objetivava reduzir os impactos da transmissão de doenças, sobretudo as DSTs/AIDS entre usuários de substâncias injetáveis. Outro avanço na política de atendimento foi a portaria 3.088/2011 que instituiu a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) que estabeleceu a organização dos serviços de saúde mental nos níveis de atenção à saúde primária, secundária, terciária e definiu o Centro de Atenção Psicossocial(CAPS) como centro da RAPS.  O uso de SPA conhecidas popularmente como drogas é um fenômeno milenar, no entanto, o debate acerca do uso problemático destas passa a ser difundido internacionalmente a partir do final do século XIX. Ao falar em problema desperta no imaginário social diversas categorias, das quais estão socialmente relacionadas, ora diretamente, ora indiretamente, tais como as juventudes, violência, pertencimento e cultura. Nos interstícios entre a saúde mental e juventude nos deparamos com uma realidade instigante, e é desta forma que surgiu este estudo, a qual objetiva analisar a trajetória de 10 usuários de SPA internados na Unidade de Desintoxicação (UD) do Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto e as relações de cuidado, estabelecidas nesse caminhar. Para isso foi traçado o perfil socioeconômico dos usuários, apreendendo a visão destes acerca das práticas de cuidados recebidas em suas trajetórias de vida. Trata-se de uma pesquisa qualitativa realizada por meio de observação direta, registro em diários de campo e entrevistas semiestruturadas. Foram seguidas as normas da resolução Nº 466/ 2012, que aprova as diretrizes e normas de pesquisas envolvendo seres humanos. O projeto foi submetido ao Centro de Estudos Pesquisa (CEAP) do referido Hospital e foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Estadual do Ceará (UECE) via Plataforma Brasil, parecer Nº 1906.604. O percurso das políticas públicas para usuários de substâncias psicoativas no Brasil é repleto de caminhos íngremes, curvas acentuadas, pontes, e até abismos que separam o cuidado dos sujeitos.  Diante das diversas problemáticas que atravessam o debate sobre a questão do uso problemático de SPA é imprescindível conhecer quem são esses sujeitos, suas percepções, interesses, seu território, as refrações da questão social que perpassam as relações socioeconômicas, corroborando com a efetivação de uma política integral, percebendo os indivíduos em sua totalidade. Assim, elaboramos uma análise do perfil socioeconômico dos usuários entrevistados através de indicadores que permitem conhecer quem são esses indivíduos, de onde falam, quais suas vivências e as condições de existência na sociedade capitalista. Os usuários entrevistados relataram que o primeiro contato com as SPA se deram na adolescência, período em que frequentavam a escola, ou nas rodas de amizades/comunidade ou até mesmo no meio familiar, no contexto de festas, comemorações, sempre apontando a necessidade de serem reconhecidos pelos seus pares. Com relação à escolaridade 60% dos usuários não concluíram o ensino médio e 90% fizeram uso de álcool, entre 12 e 17 anos.  É pertinente ressaltar que embora o álcool seja uma substância proibida para menores de 18 anos, o que se apresenta é o contato cada vez mais precoce com a referida substância. Isso também se deve a uma construção social em torno da virilidade masculina, contextos de uso na família, curiosidades, dentre outros. Afinal, as propagandas em torno do uso de álcool vendem uma imagem de alegria, boemia, dominação, etc. O uso do álcool conforme as falas revelam surgiu de uma forma sutil, sem pretensões de migrar para outras SPA. No entanto, as condições reais, vivenciada pelos jovens de não acesso a Políticas Públicas, principalmente com ausência de ações educativas direcionadas para esse segmento, tornou-se um caminho de fácil acesso para o uso de substâncias ilícitas, além disso é relevante destacar os conflitos familiares citadas como motivadoras/geradoras de uma fuga da realidade. Embora haja o descrédito da sociedade frente ao usuário de SPA, sobretudo as ilícitas, a pesquisa aponta diversos tipos de uso que transitam entre a busca por novas experiências, fugas da realidade e a busca por prazeres que superem condições de sofrimento, inclusive conflitos existenciais. Na pesquisa foi perceptível que o diálogo entre as políticas públicas e juventude ainda são frágeis, pois hegemonicamente as responsabilidades de proteção social se detém no âmbito da educação, em contrapartida as demais dimensões da vida social (cultura, arte, esporte, econômicos, comunitários) são pontuais e celetistas. Foi possível identificar a partir de uma leitura crítica da realidade de que forma os determinantes sociais estão presentes no cotidiano e como influenciaram no contato com as SPA. Frente a proposta  hegemônica de cuidado através da abstinência trazida nas políticas sobre drogas no Brasil surge a proposta da Redução de Danos a qual  tem possibilitado o desenvolvimento de abordagens terapêuticas para pessoas que não querem suspender o uso de drogas, entendendo que o contrário da dependência não é a abstinência, o contrário da dependência é a liberdade. A dependência aprisiona, o tratamento deve buscar o protagonismo e a autonomia. As falas revelam a relação de uso problemático interferindo diretamente nas relações familiares, educacionais, laborais, dentre outras. Como questionamento surge o seguinte: como o Estado tem se aproximado desta juventude, quais as estratégias utilizadas. Destarte, na defesa de uma rede intersetorial, situamos a necessidade de analisar quais os caminhos percorridos pelos usuários que em sua maioria não contam com suporte psicossocial, as oportunidades suprimidas e as múltiplas dimensões que envolvem o sujeito e que muitas vezes fica relegado a medidas de internações, quando o uso acaba atingido de forma drástica como é o caso de intoxicação por SPA.  É preciso um projeto terapêutico que considere o contexto sociocultural do sujeito e que contribua para o atendimento e reabilitação. Outra relação apontada pelo usuário refere-se à dicotomia do certo versus errado, tendo a abstinência como o padrão correto a ser seguido. A partir dessas interlocuções muitas inquietações foram geradas, à medida que temos existentes três vertentes predominantes: moralista, criminalista e proibicionista. Diante dos diversos documentos e legislações percebemos que o desafio da Reforma Psiquiátrica permanece, ao passo que hospitais gerais e uma grande parte dos serviços de saúde resistem o cuidado a esse público, os quais sempre atribuem a responsabilidade de cuidado aos CAPS e Hospitais Psiquiátricos. Antagonicamente, percebemos a ampliação e a legitimação de modelos que vão na contramão da  política de redução de danos, pois a maioria  dos serviços seguem o modelo de abstinência, como é o caso das Comunidades Terapêuticas, Hospitais psiquiátricos e infelizmente na realidade de  CAPS- AD, visto que a prática de cuidado através da redução de danos depende de um olhar ampliado do profissional frente a realidade do usuário que precisa ser melhor ampliado e difundido.

5312 A política pública para atendimento infantojuvenil dos usuários da saúde mental no município de Porto Alegre
Cristina Machado Gomes, Emylin Karoline de Souza Pedroso, Tisiane Molder Marques

A política pública para atendimento infantojuvenil dos usuários da saúde mental no município de Porto Alegre

Autores: Cristina Machado Gomes, Emylin Karoline de Souza Pedroso, Tisiane Molder Marques

ApresentaçãoO debate sobre a proteção integral da criança e adolescente foi proposto e conduzido pela sociedade civil organizada, que se fez forte e persistente nesse processo, conseguindo se manter como a protagonista. Ao longo da década de 90 foram conquistadas uma série de direitos sociais, como o Estatuto da Criança e Adolescente. No entanto, pode-se observar pontos frágeis na rede de atendimento do município de Porto Alegre, onde, ao longo do tempo observa-se a ausência de oferta de atendimento na política de saúde, principalmente no âmbito da saúde mental. Prova disso foi a inauguração, somente em 2000, do Plantão de Emergência em Saúde Mental Cruzeiro do Sul (PESM), voltado para o atendimento da população adulta. Ao longo dos anos, os trabalhadores do PESM observaram a demanda crescente da infância para atendimento no serviço, com expressivo aumento com a epidemia do crack e questão da violência urbana. Foi com o aumento da demanda e o advento da Política Nacional de Saúde Mental Infantojuvenil (2004) que se iniciou um reordenamento em Porto Alegre, possibilitando que a política de saúde mental infantojuvenil acompanhasse o processo da Política Nacional de Saúde Mental, atuando na perspectiva da Reforma Psiquiátrica. Diante do exposto, o presente trabalho, tem por objetivo apresentar uma análise da política de saúde mental na perspectiva dos direitos infantojuvenis e atendimento prestado em saúde, através de um relato das observações a partir entrevistas realizadas com trabalhadores de três serviços no município.Desenvolvimento do trabalho O período de observação dessa pesquisa foi de junho a novembro de 2016, durante o qual foram contatados três serviços do município de Porto Alegre, sendo eles: Equipe Especializada em Saúde da Criança e Adolescente Noroeste, Humaitá, Navegantes e Ilhas (EESCA NHNI), Plantão de Emergência em Saúde Mental Cruzeiro do Sul (PESM)  e Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente (CMDCA). Ao iniciar as entrevistas se realizou a leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) elaborado para a pesquisa e após o consentido dos trabalhadores. As entrevistas realizadas foram gravadas, seguindo o roteiro de elaborado no projeto de pesquisa, tendo uma duração de mais ou menos uma hora. Após a conclusão de todas as entrevistas foi realizada a transcrição das mesmas e a partir desse material foi elaborado um quadro de análise e por fim o relatório com o resultado final da pesquisa.Resultados A partir da análise dos dados das entrevistas realizadas com participantes das três instituições, EESCA NHNI, PESM Cruzeiro do Sul e CMDCA, foi construída a análise que originou esse trabalho. Há alguns anos, Porto Alegre contava com assistentes sociais e psicólogas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), assim, proporcionando um suporte de profissionais voltados para ações de saúde mental na atenção básica, possibilitando o atendimento e acompanhamento de alguns casos nas próprias UBS, mas infelizmente, houve um entendimento por parte da gestão de que o melhor seria ter equipes centralizadas para atendimento, assim, os psicólogos e assistentes sociais deixaram de realizar acompanhamentos nas UBS para atenderem em equipes centralizadas e em um único posto dos territórios (P1). Logo, começou a se montar o projeto Equipe Especializada em Saúde da Criança e Adolescente (EESCA), estabelecendo uma equipe por gerência distrital, porém, até hoje não há uma equipe com o quadro completo e nem todas possuem um ambiente adequado para realização dos atendimentos. Em termos de saúde mental infantojuvenil existe um déficit, pois a portaria estabelece um CAPS para cada 200 mil habitantes, enquanto Porto Alegre possui apenas três CAPSI para uma população estimada de 1,6 milhões. Nota-se que isso demonstra que existem falhas na gestão da saúde mental no município, pois não há um cuidado, nem um olhar cuidadoso com os usuários, apenas mantendo uma política paliativa.Realmente, não há um olhar para as causas desse quadro, não se está aprofundando o cuidado com as crianças e adolescentes, com as famílias, com os cuidadores, principalmente com os principais usuários da política de saúde mental hoje, que são as crianças e adolescentes que estão na FASE e nos abrigos. Fato constatado por meio do levantamento realizado pelo PESM no trimestre de 2014, que levantou os dados de atendimento da população infantojuvenil e ficou comprovado que mais de 50% da demanda para atendimento era de crianças e adolescentes vindos da FASE e abrigos. Assim, levanta-se a questão sobre qual tipo de suporte e atendimento se está ofertando para esses usuários. Dentro do contexto do PESM, está a questão de se realizar discussões a respeito das emergências em saúde mental há muito tempo, pois as crianças e adolescentes são atendidos em um serviço de adulto, passando por diversas situações de violações de direitos, sendo isso tão sério a ponto de o Ministério Público abrir um processo contra a prefeitura por violação de direitos, tencionando o município a adequar e ajustar a forma de atendimento prestada às crianças e adolescentes. Infelizmente, a rede de atendimento em Porto Alegre encontra diversas falhas, uma delas referente ao atendimento que deveria ser prestado às vítimas de violência e abuso sexual, que antes eram atendidas e acompanhas pelo SPC e Projovem, mas hoje, não existe nenhum serviço que seja de porta aberta para o atendimento desses casos. Apenas o Centro de Referência no Atendimento Infantojuvenil (CRAI) que realiza avaliação e presta o primeiro atendimento às vítimas, e encontra uma certa dificuldade nos encaminhamentos, tendo casos de abuso chegando nos EESCA’s após um ano do primeiro atendimento no CRAI, pois, muitas vezes, elas são encaminhadas para as UBS ou para os Centros de Referências Especializados de Assistência Social.O grande nó encontrado na rede é a ausência da oferta de serviços e atendimentos, gerando um tensionamento dentro da rede entre os trabalhadores, além de dificultar uma atuação em rede, pois, muitas vezes, as crianças e adolescentes ficam sem atendimento ou são obrigadas a serem atendidas em espaços inapropriados, como é o caso do PESM Cruzeiro do Sul.Considerações finais Ao longo desta pesquisa, buscou-se evidenciar as diversas formas de violações de direitos que ocorrem ao longo do processo de atendimento em saúde mental infantojuvenil no município de Porto Alegre. Dentre essas formas de violação, destaca-se como mais explícitas a ausência de atendimento ou falta de profissionais nos serviços. Situação que vem se intensificando ao longo da última década no município, é decorrente da falta de investimento na área da saúde mental, acentuando o quadro de violações, gerando a precarização dos espaços de trabalhos e assim, cada vez mais, crianças e adolescentes acabam ficando sem atendimentos. A fim de superar esse quadro, necessita-se de pessoas pensando e construindo juntas, nesses espaços fundamentais para a realização de discussões qualificadas sobre a necessidade de novos serviços e novas formas de realizar o fazer profissional. Por conseguinte, é fundamental que a discussão se realize em diversos níveis e que seja composta por diversos atores, como a Universidade, por exemplo, pois muitas vezes, o trabalhador acaba reduzido ao fazer profissional e não consegue ter um distanciamento para a crítica da sua atuação.Além de tudo, é primordial que se construam espaços nos quais crianças e adolescentes sejam atores, pois eles têm muito a ensinar, devem conduzir e contar suas histórias. Essencial fomentar a participação, mas para isso ocorrer, é necessário esse sentimento de reconhecimento enquanto sujeito no processo. 

5404 Saúde da Família e Saúde Mental na Atenção Básica
Rafaela Soares Mendes

Saúde da Família e Saúde Mental na Atenção Básica

Autores: Rafaela Soares Mendes

Um dos princípios da Atenção Básica à Saúde (ABS) é facilitar o acesso das pessoas à rede de saúde, incluindo aquelas que possuem algum sofrimento psíquico. Pautando-se nos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) e da Reforma Psiquiátrica, a Estratégia Saúde da Família (ESF) pode contribuir para o campo da Saúde Mental no sentido de assistir a pessoa em sofrimento psíquico de forma desistitucionalizada, valorizando a territorialização. Partindo dessas informações, investigou-se os conhecimentos e práticas da ESF sobre a função da ABS nas linhas de cuidado em saúde mental. Para tanto, foi realizada uma pesquisa qualitativa, descritiva e analítica, com equipes de médicos e enfermeiros da ESF, do Município de São Luís, Maranhão. Os dados foram coletados a partir de entrevistas semiestruturadas e analisados com a técnica de Análise Temática. Este estudo faz parte da pesquisa “Percepções de Profissionais e Usuários da Rede de Atenção Psicossocial acerca do Desenvolvimento de Linhas de Cuidado em Saúde Mental”, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Ceuma sob parecer de N° 1.720.219. Foram entrevistados sete profissionais de quatro unidades diferentes, sendo três médicos e quatro enfermeiros. Os resultados apontaram que poucas ações em saúde mental eram desenvolvidas nas referidas unidades e que a comunicação entre diversos pontos da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) era frágil. Após os dados encontrados, elaborou-se um projeto de intervenção para ser apresentado à Secretaria Municipal de Saúde (SEMUS) para ter aplicado nas unidades para fortalecer o elo das equipes com os outros serviços da Rede para atender o indivíduo na sua integralidade, como é estabelecido nos princípios do SUS.

3743 DESAFIOS PARA A PSICOLOGIA EM SITUAÇÕES DE SUICÍDIO NAS POPULAÇÕES INDÍGENAS
Ana Beatrice Colares Rocha, Ingrid Sabrina Batista Costa, Larissa Vitória Lopes Ribeiro De Souza, Lívia Cristinne Arrelias Costa

DESAFIOS PARA A PSICOLOGIA EM SITUAÇÕES DE SUICÍDIO NAS POPULAÇÕES INDÍGENAS

Autores: Ana Beatrice Colares Rocha, Ingrid Sabrina Batista Costa, Larissa Vitória Lopes Ribeiro De Souza, Lívia Cristinne Arrelias Costa

A atual conjuntura político-social brasileira tem fortalecido situações de vulnerabilidades diversas das populações indígenas. Em detrimento das formas de vida tradicionais, integradas de maneira saudável com o ambiente natural em que vivem, a sede de lucros cada vez maiores tem destituído este grupo populacional de seus territórios, que significam muito mais do que o espaço geográfico: inclui, inclusive, espiritualidade e identidade. Partindo destas reflexões iniciais, este trabalho aborda uma das questões mais recentes voltadas para as populações indígenas, o suicídio, o qual tem despertado interesse cada vez maior, devido o aumento de sua incidência. Tem como objetivo compreender a ocorrência de episódios de suicídio entre indígenas no território brasileiro a partir de uma revisão da literatura da área da Psicologia, a fim de se pensar em estratégias de atendimento preventivo e pós ventivo junto a esta população. Reconhecer os determinantes sociais da saúde destas populações, bem como os efeitos de uma atitude tão extrema quanto, o suicídio pode ajudar a garantir o sonhado bem viver que tanto buscam os povos indígenas na atualidade. Fatores como o alcoolismo, problemas amorosos, crises políticas e a invasão de território são algumas causas indicadas pela literatura, que deixam as aldeias mais propensas ao suicídio, tornando-se este um ato simbólico de mal estar coletivo que se apresenta individualmente. Para a reflexão inicial aqui proposta, foi realizado um estudo qualitativo de revisão de literatura da área da Psicologia, utilizando-se como descritoras as palavras “suicídio” e “indígenas”, a partir da ferramenta de busca google acadêmico. Foram encontrados treze (13) trabalhos, publicados entre os anos de 2009 a 2017, todos escritos em português. Destes, foram analisados os cinco (5) artigos que apareceram nos resultados. Buscou-se compreender a ocorrência desse fenômeno entre os povos indígenas para que possa haver reflexões e construção de estratégias de acolhimento e atendimento às pessoas que estejam passando por esta situação extrema. Os trabalhos analisados objetivaram problematizar, corroborar com a revisão conceitual do suicídio entre indígenas, assim como apresentar e discutir os dados levantados em pesquisa de campo em relação as condições sociais, as representações sociais do suicídio para populações indígenas, caracterizando os suicidas, descrevendo motivações e as taxas de mortalidade por suicídio. Os trabalhos apresentaram um grupo etário na faixa de 12 a 41 anos, com predominância do gênero masculino. Considerando a importância da juventude para a continuidade das formas de vida das populações indígenas, pode-se pensar neste dado como um alerta para o um possível genocídio ainda em curso no Brasil, este que se iniciou em 1500 com a chegada de colonizadores portugueses. Contudo, o processo atual tem sido invisibilizado por causas diversas, dentre as quais pode-se destacar a formação inadequada de profissionais de saúde para lidar com esta realidade. As regiões descritas nestes estudos foram a cidade de São Gabriel da Cachoeira, o município de Tapauá, ambos no estado do Amazonas; Guaíra, no Paraná e os estados de Roraima e Mato Grosso do Sul. Percebe-se, assim, a ausência de estudos – ou seria de olhares? – mais criteriosos em outras localidades do território nacional, onde existe a presença maciça tanto de populações indígenas quanto do agronegócio, da mineração, da extração ilegal de madeira e da implantação de grandes empreendimentos, os quais tendem a expulsar, quando não dizimar, populações indígenas inteiras de seus territórios. Estes estudos indicaram, ainda, que a motivação para se concretizar o suicídio se dá por diferentes fatores dentre os quais pode-se citar: expulsão do seu território para as cidades, perda de identidades  culturais, conflitos familiares diversos, desemprego ou impossibilidade de garantir a própria subsistência e de seu grupo comunitário, uso descontrolado de álcool e outras drogas, invasão de seu território, doenças diversas e impossibilidade de cuidados a partir dos saberes tradicionais, morte por armas de fogo, exclusão social e falta de alimento. Além de todos estes determinantes, os diversos grupos indígenas espalhados pelo território nacional ainda são incompreendidos em suas crenças, costumes e tradições, por se apresentarem diferentes do padrão euro normativo ocidental, o qual deseja transformá-los em um “igual”, ou civilizado. Contudo, há resistência por parte dos indígenas, grupo mais fraco diante de fazendeiros e grandes empreendedores que detêm força econômica e politica – vide as chamadas bancadas do “boi” e da “bala”, em Brasília. Com o aumento da exclusão social, a morte ritual vem a ser uma resposta de resistência e afirmação cultural, através da qual estas populações buscam o tão sonhado bem viver que lhes foi usurpado. A fim de que não haja negligencia em relação aos direitos dos povos indígenas, é necessário aumento, estruturação e melhor capacitação de equipes dos órgãos públicos que atendem a essa população. Em relação à Psicologia, vale ressaltar a escassez de produções em português que possam auxiliar no desenvolvimento de metodologias e de instrumentais adequados à realidade dos povos indígenas. Sem esta produção, fica difícil criar espaços e momentos de escuta, acolhimento e orientação para os/as jovens, diferente do olhar colonizador, mas de alguém que compreende e acolhe as suas demandas. É importante e necessário que pesquisadores da área da saúde saiam da sua zona de conforto e busquem compreender, perceber a dinâmica própria das comunidades indígenas e pensar em formas de manejo especificas daquela realidade. Assim, as recomendações de políticas públicas de saúde em questões referentes ao suicídio, poderão ser, de fato, concretizadas, pois é essencial que tanto as autoridades públicas, quanto as/os próprias/os profissionais se deparem e reconheçam a realidade em que estes povos vivem. A Psicologia deve lançar um olhar mais qualitativo para esta situação, considerando os múltiplos fatores sociais, culturais e simbólicos que tem levado ao crescimento dos casos de suicídio nas populações indígenas, originaria do território nacional, e que vem sofrendo um etnocídio escancarado desde a chegada dos colonizadores portugueses.  Junto com outras categorias profissionais e mesmo organizações não governamentais que lutam pelos direitos humanos, a Psicologia deve pautar sua atuação em uma ética e responsabilidade que ajude a fortalecer as lutas e resistências próprias desta população, por sua vida com dignidade. A partir do que foi exposto, observa-se que falar sobre o suicídio entre indígenas se torna uma forma de resistência, pois ainda se configura como uma população invisibilizada, pouco reconhecida e negada em suas especificidades e em sua cidadania, inclusive na própria formação em Psicologia, o que se reflete na escassez de estudos e, provavelmente, de reflexões sérias e bem embasadas sobre esta questão. Os dados preliminares aqui descritos devem levar a uma reflexão mais aprofundada a respeito dessa problemática, a fim de se garantir o reconhecimento e o fortalecimento dos modos únicos de vida dos povos originários do território nacional, em uma concepção de direitos humanos. E isto vale para mudanças de postura profissional tanto de quem está na pratica quanto ainda na graduação.  

680 O CUIDADO EM SAÚDE MENTAL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: A CONSTRUÇÃO DE UM GRUPO TERAPÊUTICO NA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA.
Dassayeve Távora Lima, Bianca Waylla Ribeiro Dionisio, Klivia Sibele Távora Lima, Lívina Letícia Costa Araújo

O CUIDADO EM SAÚDE MENTAL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: A CONSTRUÇÃO DE UM GRUPO TERAPÊUTICO NA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA.

Autores: Dassayeve Távora Lima, Bianca Waylla Ribeiro Dionisio, Klivia Sibele Távora Lima, Lívina Letícia Costa Araújo

RESUMO: APRESENTAÇÃO: Este trabalho objetiva relatar a experiência de construção de um grupo terapêutico em saúde mental por residentes em saúde da família, atuantes no Centro de Saúde da Família (CSF) Alto da Brasília, em Sobral/CE, no período de fevereiro à setembro de 2017. Tal experiência diz da implementação de um grupo terapêutico na linha de cuidado em saúde mental da unidade, no qual se objetiva ofertar ações de promoção de saúde mental no nível primário da atenção, partindo de metodologias e atividades diversas que apostam na autonomia do usuário e na sua capacidade de desenvolver potencialidades, construir novos vínculos sociais e ressignificar, por meio da expressividade, questões relacionadas ao seu sofrimento psíquico. Preconiza-se que a atenção primária á saúde (APS) organize seus processos de trabalho no cotidiano da assistência de modo que estes sejam orientados pelos princípios da territorialização, integralidade, longitudinalidade e atuação multiprofissional, apostando nas tecnologias relacionais como basilares do cuidado. É este enfoque no vínculo e nas tecnologias leves no cuidado em saúde que a APS atua como um espaço propício para o olhar integral e humanizado, concebendo o sujeito como um ser biopsicossocial. Este cuidado que aponta para a integralidade do sujeito, permite pensar em uma ampla gama de ações assistenciais que impliquem na melhoria da qualidade de vida dos sujeitos nas mais diversas dimensões da vida, fortalecendo a importância de se trabalhar o cuidado em saúde mental no nível primário da atenção. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o cuidado em saúde mental na APS, corresponde à efetivação plena da mudança do paradigma asilar para a construção de um modelo de assistência substitutivo, pois a superação do modelo hospitalocêntrico e manicomial só é possível com a construção de um modelo de atenção psicossocial de cunho comunitário e que atue no sentido de diminuir estigmas e fortalecer a reabilitação psicossocial destes sujeitos. Por conta da capilaridade característica da APS, a mesma ocupa um espaço estratégico na oferta de ações de cuidado em saúde mental de caráter territorial e comunitário. Sabe-se que, apesar da reforma psiquiátrica brasileira surgir no bojo da reforma sanitária, a articulação entre ambas pouco tem avançado na prática e as ofertas de cuidado em saúde mental na APS ainda são experiências bastante incipientes. Apesar desta limitação na assistência ainda ser uma realidade na maior parte dos serviços de APS no Brasil, no município de Sobral-CE, o cuidado em saúde mental é prioritariamente territorial e conduzido pelos Centros de Saúde da Família (CSF), contando com o apoio matricial das equipes especializadas da Rede de Atenção Psicossocial. Neste contexto, o CSF do Alto da Brasília serve como referência no cuidado em saúde mental na APS no município, pois conta com uma linha de cuidado bem estabelecida, possibilitando uma alta resolutividade dos casos ainda no nível primário da assistência. Neste território em específico, identificou-se uma grande quantidade de usuários que demandavam cuidados sistemáticos em saúde mental. Sendo assim, foi pensado então em um grupo que pudesse dar suporte em saúde mental e que se encaixasse no fluxograma de atendimento do serviço, alinhado também com a atenção compartilhada em saúde mental e os serviços de assistência. Nesse sentido, este trabalho objetiva compartilhar a experiência de construção e implantação de um grupo terapêutico em um serviço de APS, enfatizando não só a possibilidade, mas sim, a necessidade de ofertas de cuidado em saúde mental neste nível de atenção. DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: O grupo terapêutico em saúde mental do CSF Alto da Brasília foi idealizado por uma equipe da Residência Multiprofissional em Saúde da Família e tem como objetivo realizar o acompanhamento a usuários que demandam cuidados em saúde mental e que possam ser beneficiados pelas atividades terapêuticas realizadas no grupo. Tais atividades se orientam principalmente pelos princípios da reforma psiquiátrica e sua articulação com a estratégia saúde da família, no sentido da promoção da saúde. Os usuários são acompanhados longitudinalmente e se aposta na liberdade, na escuta empática, na arte, e na humanização do cuidado como ferramentas terapêuticas no cuidado. Os usuários que participam destas atividades são prioritariamente: 1) pessoas que fazem uso crônico de psicofármacos, 2) que foram acompanhados pelo CAPS Geral do município e que receberam alta, 3) egressos de internações na unidade psiquiátrica do hospital geral que oferece suporte à demandas de crise, ou ainda, 4) quaisquer usuários em situação de sofrimento psíquico que possa ser beneficiado pelas atividades terapêuticas realizadas no grupo. Com a identificação dos usuários que demandavam de cuidados sistemáticos em saúde mental pela unidade, foram planejadas ações de mobilização dos mesmos e de alinhamento teórico-conceitual para a equipe de referência da unidade. Após a mobilização dos profissionais e o convite feito aos usuários, deu-se início às atividades do grupo, com periodicidade quinzenal. Os horários, dia da semana e local do grupo foram pactuações feitas com os próprios participantes. As atividades realizadas são dinâmicas e participativas, buscando a expressividade destes usuários e respeitando os limites de cada um. No geral, realizam-se atividades como oficinas, atividades arteterapêuticas, práticas corporais, técnicas de relaxamento (meditação, autocinética e consciência corporal), exibição de filmes e rodas de conversa. Dentre algumas metodologias utilizadas para a condução dos momentos, destacam-se a da colcha de retalhos, a construção do painel coletivo, expressividade com argila, pintura em pedras, cine debate sobre o dia nacional da luta antimanicomial, oficina de medicamentos fitoterápicos, atividades de pintura e arteterapia. Os facilitadores das atividades do grupo são os residentes em saúde da família, a preceptora de campo e contamos ainda com o apoio de alguns agentes comunitários de saúde. RESULTADOS: Desde sua implantação, o grupo tem se mostrado um dispositivo potente na promoção de saúde mental, apresentando-se como um importante recurso na construção de planos de cuidado e projetos terapêuticos singulares. A oferta de um espaço acolhedor e facilitador de atividades expressivas têm promovido um fortalecimento da autonomia e do autocuidado destes usuários. Tal retorno é obtido pelos mesmos na avaliação das atividades que acontece ao final de cada momento. Este grupo ainda atua como um espaço de cuidado com os cuidadores, pois alguns profissionais da unidade participam das atividades no sentido de vivenciar um momento de cuidado de si. O grupo apresenta ainda uma dimensão formativa, pois além da formação dos próprios residentes em saúde da família, atua como um espaço de educação permanente em saúde para os profissionais da equipe mínima, e recebe também acadêmicos que procuram compreender como acontece o fazer da saúde mental e da atuação multiprofissional na atenção primária. CONSIDERAÇÕES FINAIS: A experiência relatada se apresenta como uma estratégia promotora de saúde mental, com enfoque no papel fundamental da APS nos cuidados em saúde mental. Cabe ressaltar que esta experiência se fundamenta no paradigma do cuidado e da promoção da saúde, onde, mais do que buscar a “cura” das pessoas em sofrimento psíquico, objetiva-se fortalecer gradientes de autonomia, compreendendo-os como fatores de qualidade de vida. Por fim, enfatiza-se a importância do cuidado em saúde mental na APS, entendendo-o como critério fundamental para a efetivação de um modelo substitutivo alinhado com os princípios da reforma psiquiátrica brasileira.

3711 Criação de política de Saúde Mental da Universidade Federal de São Carlos
Taí­s Bleicher

Criação de política de Saúde Mental da Universidade Federal de São Carlos

Autores: Taí­s Bleicher

A reforma psiquiátrica brasileira tinha como primeira missão acabar com os manicômios e todas as instituições que possuíssem caráter manicomial e criar uma rede substitutiva de cuidados. Os primeiros equipamentos da reforma foram, portanto, sobretudo voltados ao público psicótico. Entretanto, com o seu avançar, as demais demandas em saúde mental foram necessitando de programas específicos de cuidado, inclusive tendo em conta os distintos públicos especialmente vulneráveis. Nas universidades, os principais marcos legais que atingem seus públicos geram o SIASS – Sistema Integrado de Atenção à Saú­de do Servidor e o PNAES - Programa Nacional de Assistência Estudantil, e, portanto, impulsionam a criação das políticas públicas locais. A implementação do SIASS e do PNAES foi bastante distinta, entretanto. Para o primeiro, foram criadas claras diretrizes, metas de funcionamento, e foram oferecidas diversas capacitações para viabilizar o novo modelo de atuação. A implementação do PNAES, entretanto, não foi tão bem estruturada, ocorrendo de forma bastante distinta nas diversas universidades públicas federais brasileiras. Ambas as políticas de Saúde foram marcadas por forte investimento financeiro quando foram criadas, ainda na Era Lula, e que foram sofrendo grandes cortes a partir da Era Dilma, e, de forma radical, desde o golpe de Estado sofrido no Brasil em 2016. O PNAES fez parte de um movimento maior, de um importante processo de expansão e interiorização de universidades. Além do investimento e da ampliação das estruturas, buscava-se fazer uma profunda reforma na educação superior, no nível da graduação, para o aumento da qualidade dos cursos, e melhor aproveitamento de estruturas físicas e recursos humanos das universidades e institutos federais, com diminuição das taxas de evasão e diversificação das formas de acesso. A criação de cotas de ingresso nas universidades foi uma das tentativas de ampliação de seu acesso para públicos tradicionalmente marginalizados, gerando a necessidade de complexificação das ações de Assistência Estudantil. O objetivo deste trabalho é apresentar as ações em Saúde Mental desenvolvidas na Universidade Federal de São Carlos – UFSCAR e o seu projeto de alinhamento com a perspectiva da Atenção Psicossocial, a partir do entendimento de que, tanto servidores públicos quanto estudantes universitários são públicos especialmente vulneráveis para a Saúde Mental. Trata-se, portanto, de um relato de experiência. Como em todas as universidades federais, esse cenário atingiu diretamente a Universidade Federal de São Carlos – UFSCAR, que já executava uma Política de Assistência Estudantil, em consonância com o PNAES. No âmbito da Saúde Mental, o seu Departamento de Atenção à Saúde - DeAS – realizava acolhimentos e triagens; psicoterapia individual; grupos terapêuticos de apoio; oficinas psicoeducativas; atendimento e orientação de pais de alunos, professores e coordenadores de curso; co-coordenação de programa na rádio UFSCAR dedicado ao tema Saúde; supervisão de estagiários do curso de Psicologia da UFSCar; participação em comissões de avaliação de servidores deficientes; estudos de caso; interlocução e encaminhamentos para a Rede de Atenção Psicossocial – RAPS; palestras; visitas hospitalares ou domiciliares, dentre outras atividades. As ações, no entanto, estavam pouco articuladas às outras ações já existentes geradas nas unidades acadêmicas da UFSCAR e à produção científica na área. Por isso, iniciou-se a criação de uma política pública de saúde mental da UFSCAR, para servidores e alunos. Inicialmente, buscou-se mapear as ações já existentes, seus responsáveis, e formar um corpo interdisciplinar que levasse à frente o trabalho. Este grupo de trabalho conta com o apoio da gestão atual, e, especificamente, da Pró-reitoria de Assuntos Comunitários e Estudantis - PROACE. Em fase de tramitação, foi criado programa de extensão envolvendo os departamentos acadêmicos de Medicina, Psicologia, Terapia Ocupacional; além do Hospital Universitário; Secretaria Geral de Ações Afirmativas, Diversidade e Equidade e PROACE. As ações do programa de extensão já estão em andamento, tendo os seguintes eixos de ação: 1. Construção da política de Saúde Mental do Estudante Universitário; 2. Frente de enfrentamento ao suicídio do estudante da UFSCAR; 3. Produção de cartilha sobre saúde mental na universidade; 4. Diagnóstico institucional e perfil de saúde mental na comunidade universitária; 5. Frente de redução de danos; 6. Articulação com a Rede de Atenção Psicossocial dos municípios. Como em toda política pública de Saúde, inicia-se o trabalho a partir do levantamento epidemiológico do público atendido, com vistas ao melhor planejamento das futuras ações. Este eixo se dará por meio de pesquisa longitudinal com seguimento de dez anos da comunidade universitária, quanto ao sofrimento psíquico. O trabalho se justifica academicamente, uma vez que há poucos estudos sobre a Saúde Mental do estudante universitário, especificamente, e normalmente são voltados para pequenos grupos. Entende-se que é preciso colaborar com estudos de abrangência nacional e contribuir com dados locais e que a assistência não pode realizar suas ações desconectadas da produção acadêmica da área. Da mesma maneira, no que tange à Saúde do trabalhador. A ideia é que o programa ultrapasse o âmbito meramente administrativo e articule ensino, pesquisa, assistência e extensão. O eixo de construção da política contempla, também, a sua escrita. Portanto, paralelamente, ao programa de extensão, criou-se uma comissão para sua redação e acompanhamento. Em caráter emergencial, devido aos casos de tentativa e realização de suicídios entre estudantes, foi criada a frente de enfrentamento ao suicídio do estudante da UFSCAR que visa ao cuidado dos casos já existentes, disponibilizar informações para a prevenção de novos casos e, ainda, a promoção de saúde mental. Da mesma maneira, devido à já constatada alta prevalência de casos de AIDS e Sífilis entre os estudantes da UFSCAR, além dos relatos de abuso de substâncias psicoativas, foi pensado no eixo de redução de danos, que, no primeiro semestre de 2018 funcionará como capacitação interna sobre a teoria e a prática da redução de danos. Em um modelo de sistema universal de Saúde, é impensável que essas ações estejam desconectadas das redes sanitárias das quatro cidades em que estão os campi da UFSCAR. As estratégias integradas servem, inclusive, para evitar que a Universidade assuma responsabilidades que são municipais, especialmente, no âmbito do tratamento. A ideia é garantir a continuidade de cuidados: promoção e prevenção em saúde mental no âmbito universitário, com tratamento nas RAPS. Portanto, o eixo de articulação com as redes de atenção busca criar uma agenda comum de pactuações, distribuição adequada de responsabilidades e tensionamento político na busca de soluções. Finalmente, pretende-se disponibilizar, de maneira acessível, as informações oriundas de todos esses eixos, por meio de uma cartilha que tenha como público a comunidade universitária. As ações ainda estão no seu estágio inicial. Neste momento, é possível apontar para a integração dos diversos atores que trabalham com Saúde Mental na UFSCAR, a criação de um grupo de trabalho especialmente dedicado ao tema e a construção de uma agenda de ações comum e integrada. A criação e execução desta política, em um período de ataque direto aos serviços públicos, em especial os da Educação e da Saúde, são, sobretudo, uma estratégia de resistência. Permitem que os alunos dos diversos cursos envolvidos aprendam como criar, executar, acompanhar e avaliar uma política pública em Atenção Psicossocial em um momento em que o próprio Ministério da Saúde faz violentos ataques ao modelo. Avança, mesmo com todas as adversidades causadas pelos cortes financeiros e demais estratégias criadas para destruir as políticas públicas sociais.

5187 Uma experiência em mim... ‘De Braços Abertos’ à ‘Redenção’: modelos em disputa
Patrícia Carvalho Silva

Uma experiência em mim... ‘De Braços Abertos’ à ‘Redenção’: modelos em disputa

Autores: Patrícia Carvalho Silva

Tal resumo, serve-me quase como um desembocar de parte do desejo de escrever o que foi a experiência vivida enquanto Coordenadora da Linha de Cuidado de Saúde Mental numa Organização Social do município de São Paulo, sendo que um dos territórios de gerenciamento de serviços de saúde mental eram localizados na região Central deste município do ano de 2016 a 2017. Tal vivência trouxe consigo uma imersão em dois momentos distintos no que diz respeito a política pública municipal sobre drogas, mais especificamente em dois Programas distintos “De Bracos Abertos” e “Redenção”. Utilizarei para tanto de duas cenas: Cena 1: a primeira vez que entro num Hotel alugado para a moradia de 100 beneficiários do Programa “DBA” e seus filhos, uma criança de aproximadamente 9 anos me diz: “tia, você veio para conhecer minha mansão?” Cena 2: após uma grande ação policial em 21 de maio de 2017, um usuário machucado na rua, este com os pés atrofiados e que se locomovia com um skate é levado para o Pronto Socorro do território. Eu era a única profissional ali disponível para acompanhar a ambulância e indo junto com o mesmo, ele fala: “me tiraram meu único jeito de andar na cidade”. Duas cenas! Dois modos de intervir! Duas concepções de sujeitos! Dois modos de se pensar a clínica! Elas colocam holofotes no fato de que políticas públicas se desenham frente a uma racionalidade, esta que vai se modificando na história. Foucault (2000) refere que saberes e técnicas clínicas, médicas e não médicas, psicológicas constituem um corpo de discursos, práticas profissionais, técnicas e sistemas de julgamento que traduzem um determinado ethos que tem um importante papel na produção e agenciamento da subjetividade no contemporâneo, com impacto nas práticas médicas, no cuidado e na gestão de saúde a elas relacionadas. Neste sentido, estar na gestão e acompanhar os processos de cuidado se modificando de forma abrupta, tornou-se para mim uma experiência que refletiu e reflete a disputa histórica no campo do cuidado às pessoas usuárias de drogas, principalmente àquelas que estão em cenas de uso abertas e urbanas. O município de São Paulo, é marcado pela história de aproximadamente 25 anos, nos quais algumas ruas do bairro da Luz foram sendo ocupadas por um grande número de pessoas em situação de rua e uso de crack. Apesar da grande vulnerabilidade ali presente, tal local ficou conhecido muito mais pelo uso de crack, e deste modo, desde os anos de 1990 várias iniciativas do poder público foram tentadas com objetivo de reformular as características da região, baseadas na revitalização do espaço urbano. Entre estas, numa tentativa de intervenção, sob a gestão de Fernando Haddad (PT), iniciou-se a implementação do Programa “De Braços Abertos”, criada enquanto uma Política Intersetorial Municipal, apresentando-se com duplo objetivo: intervenção no espaço urbano entendido como degradado e violento e apoio para as pessoas com uso problemático de álcool e outras drogas. Apoiava-se em conceitos norteadores numa lógica de redução de danos: primeira moradia, inspirado no conceito de ‘Housing First’; baixa exigência - não são definidos condições a priori que para inserção ao programa; garantia de direitos - partindo do reconhecimento da extrema desvantagem e vulnerabilidade destas pessoas e oferece um pacote de direitos: moradia, alimentação, trabalho e renda. O projeto de cuidado dos beneficiários do programa, ofertava vagas em hotéis, três refeições diárias e renda frente a inserção em diferentes oficinas de trabalho e capacitação, constituindo-se a partir daí articulações de produção de cuidado que se fizessem necessárias para cada usuário, pautando-se no respeito a singularidade e principalmente, na pessoa como articuladora do seu próprio cuidado. Na disputa eleitoral de 2016, que em contraponto a tal programa, a discussão sobre como acabar com a “cracolândia” retoma centralidade nos debates. De acordo com a oposição ao governo então vigente, o DBA reforçava o tráfico na região, haja visto o aumento de circulação de dinheiro pelo pagamento do trabalho realizado pelos beneficiários e não responsabilizava o usuário para o tratamento da dependência química. A ideia de um território sem lei, habitado por pessoas sem crítica sobre sua condição estava a todo momento em pauta na discussão, deste modo, o debate foi se desenhando na perspectiva de que ações mais “firmes” precisavam ser realizadas e a resposta seria a intensificação de internações, inclusive compulsórias, e aumento de operações de combate ao tráfico. O candidato João Dória (PSDB) ganhou a disputa eleitoral para Prefeito e assim lançou mão a partir de janeiro de 2017 d de um programa que foi sendo construído como promessa de acabar com aquela cena de uso e tráfico, intitulado como ‘Redenção’. O delineamento do novo programa foi sendo apresentado de acordo com cada uma das intervenções, mas nenhuma novidade era notada. Como exemplos, diversas ações policiais de combate ao tráfico[1], abertura de 290 novos leitos em hospitais psiquiátricos[2] para desintoxicação de usuários de álcool e outras drogas e a mídia construindo uma narrativa ostensiva e pejorativa frente a situação de tráfico na cracolândia. Em 21 de maio de 2017, uma megaoperação policial se deu nas ruas que ficavam o maior número de pessoas em situação de rua e foi a partir daí que ações no âmbito da Assistência Social e Saúde foram sendo efetivadas, firmando com intensidade e rapidez essa nova formulação de cuidado, o Programa Redenção. A construção de Centros de Acolhida Emergenciais, um contêiner intitulado como CAPSad 24h – apesar de não ter equipe e estrutura mínimas conforme Portaria nº 130/2012 – e solicitação da Prefeitura para autorização do Ministério Público para remoção compulsória de usuários para internação, esta então não autorizada após recurso. O tratamento parte da premissa de desintoxicação e internação como estratégia para inserção nas demais ações, sendo que há um caminho a priori no qual o usuário terá que caminhar para ser inserido nas demais ofertas. Perspectiva esta conhecida como “treatment first”, no qual apenas após o usuário engajar num tratamento contra o abusivo de drogas ele estará “qualificado” para receber outras ofertas de cuidado. Da perspectiva da ampliação de direitos: Cena 1 – a moradia, um lugar para chamar de seu, ambiente protegido, o sujeito é cidadão/tem direito; para a perspectiva de que há um mal A DROGA : Cena 2 –  a impossibilidade da circulação, uma cidade que não lhe quer, o sujeito é zumbi/criminoso/drogado. [1] Haja visto o Dossie que o Coletivo “A Craco resiste” elaborou chamado Agressões e Violações na Cracolândia, in: http://www.ctviva.com.br/blog/wp-content/uploads/2017/05/Agress%C3%B5es-e-Viola%C3%A7%C3%B5es-na-Cracol%C3%A2ndia.pdf [2] Diário Oficial São Paulo, 27 de maio de 2017.