202: Educação permanente e formação de trabalhadores em saúde: quando ensinar e aprender se compõem com o trabalho
Ativador: A definir
Data: 01/06/2018    Local: FCA 02 Sala 06 - Jaraqui    Horário: 10:30 - 12:30
ID Título do Trabalho/Autores
3832 Cartografia da educação em saúde e sua interface com a educação da diferença: relato de uma experiência do curso EdPopSUS em Parnaíba-PI.
Antônio Vladimir Félix-Silva, Alessandra Savia da Costa Masullo

Cartografia da educação em saúde e sua interface com a educação da diferença: relato de uma experiência do curso EdPopSUS em Parnaíba-PI.

Autores: Antônio Vladimir Félix-Silva, Alessandra Savia da Costa Masullo

A institucionalização do Sistema Único de Saúde – SUS é uma das ações resultantes dos movimentos da Reforma Sanitária e do movimento de Educação Popular em Saúde que surge, especialmente, na década de 1970, em um contexto marcado pela falta de acesso à saúde e aos serviços de saúde e pela luta em defesa da promoção da saúde e do que se tornou reconhecido, na VIII Conferência Nacional de Saúde e na década de 1980, como determinantes sociais da saúde. A criação dos conselhos de saúde e das políticas de promoção da equidade em saúde, a partir de 2003, demandou até 2014, forças de investimento no controle social e na educação em saúde. Nesse sentido, foram lançados, a partir de 2013, alguns cursos. Dentre os quais, destacamos o Curso de Aperfeiçoamento em Educação Popular em Saúde – EdPopSUS, que visa contribuir com a implementação dos princípios e diretrizes da Política Nacional de Educação Popular em Saúde - PNEP-SUS, a partir da qualificação de lideranças comunitárias e de profissionais de saúde, preferencialmente, agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias que atuam nos cenários de práticas da Atenção Básica em Saúde.   Este é o relato de uma experiência vivenciada com 05 homens e 55 mulheres de 02 turmas do curso EdPopSUS II, na cidade de Parnaíba – PI, em 2017. Trata-se de um estudo acerca da educação em saúde e sua interface com a educação da diferença, realizado pelo coordenador e por uma educadora do curso. Neste relato, objetivamos apresentar narrativas de uma cartografia dos modos de subjetivação que caracterizam ações de participação comunitária e educação da diferença no curso EdPopSUS.   No que se refere à cartografia para produção e análise das informações, realizamos 05 encontros, nos quais utilizamos como estratégias metodológicas: 02 rodas de conversa e narrativas com uso de caixa de afecções e de fanzine, 01 tenda do conto e 02 círculos de cultura tendo como tema gerador “território, lugar de memória e história”, em duas comunidades. Além disso, mapeamos processos de subjetivação em educação da diferença que emergiram em alguns momentos durante os 17 encontros previstos no curso.   Os resultados da análise dos modos de subjetivação cartografados mostram: 1) a falta de cobertura da atenção básica na Comunidade Quilombola Itaperinha e no Assentamento Lagoa do Prado em função do número de pessoas dos dois territórios não justificar o deslocamento de ACS. Na narrativa da participante da comunidade quilombola, percebemos atravessamentos macropolíticos tais como a falta de serviços de assistência social e de atenção à saúde no munícipio, sendo necessário, nas situações de emergência, o deslocamento das pessoas da comunidade para um hospital do município mais próximo; 2) no círculo de cultura realizado no Assentamento do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem-terra, no qual participaram também 15 pessoas do assentamento Lagoa do Prado, além das pessoas do EdPopSUS, mapeamos processos de subjetivação de uma jovem assentada que mostram os modos de resistência da juventude que participa do curso Pedagogia da Terra, depois de ocupar a reitoria da Universidade Estadual do Piauí – UESPI, como também atividades de educação junto a professores e professoras do ensino básico por meio do projeto Chão da Escola, priorizando temas geradores relacionados às necessidades das crianças e adolescentes assentados e ao Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – Pronera; 3) dos processos de singularização que marcam Itaperinha, no âmbito micropolítico, mapeamos formas de cuidado em saúde que expressam solidariedade e reciprocidade no enfrentamento à violência doméstica e modos de produção de saúde a partir do pertencimento ao território, via Umbanda, Pastoral Quilombola, Dança do Caroço e Festejos de São Sebastião, São Benedito, São Cosme e São Damião, São Gonçalo, dentre outros; 4) a questão relacionada à religiosidade de matriz africana foi motivo de intervenção no primeiro encontro e um analisador que emergiu nas duas turmas, durante todo o curso, abrindo espaço para intervenções da educadora; 5) no círculo de cultura realizado no território de pesca da Pedra do Sal, os modos de subjetivação em arte e cultura evidenciaram o reconhecimento do trabalho das rezadeiras, da utilização das plantas medicinais – fitoterápicos e medicina popular –  e da brincadeira do coco, do bumba-meu-boi, dança cigana e dança regional como práticas de promoção da saúde de artistas jovens, adultos e adultas no território; 6) os modos de subjetivação em gênero e violência contra a mulher marcaram o EdPopSUS, que teve também a participação de um balarorixá, de uma travesti, de quatro pescadoras artesanais e de duas mulheres participantes da luta antimanicomial, uma pescadora e uma sem-terra assentada; 7) os modos de subjetivação das ACS mostram a interface entre o trabalho de educação em saúde e a participação comunitária via Pastoral da Criança e em outros movimentos sociais na perspectiva da garantia de direitos e do enfrentamento às injustiças sociais e a pouca participação comunitária na articulação dos determinantes sociais da saúde: segurança alimentar, moradia, educação, trabalho, renda, emprego, lazer e acesso à arte e à saúde.   Com as análises desses modos de subjetivação, concluímos: a) as ações de participação comunitária e educação em saúde que caracterizam o território e a produção de subjetividade na contemporaneidade são marcadas pela aposta na educação da diferença e pelo desejo de afirmação das minorias; b) a participação de trabalhadoras, trabalhadores, usuárias e usuários do Sistema Único de Saúde, familiares, grupos, comunidades e movimentos sociais apontam para a promoção da saúde como garantia de direitos e reinvenção da cidadania – cidadania menor – em contextos atravessados por processos históricos de exclusão/inclusão e por uma conjuntura política instável; c) as dificuldades e os desafios enfrentados para a efetivação da equidade em saúde e das diretrizes da PNEPS-SUS mostram o sofrimento ético-político relacionado às minorias (LGBTTI, negros e negras, mulheres, pescadoras e pescadores artesanais, população em situação de rua, homens e mulheres sem-terra e sem-teto etc.); d) a sistematização dessa experiência vivenciada nos encontros com participantes do EdPopSUS e com pessoas assentadas, rezadeiras e artistas caracteriza ações de participação comunitária e educação em saúde que contribuem para a educação da diferença e para o reconhecimento da comunidade como autora de processos de produção e promoção da saúde e como coautora de processos instituintes de educação permanente em saúde na Atenção Básica. Portanto, a cartografia dos modos de subjetivação da educação em saúde na interface com a educação da diferença traduz os modos de vida das pessoas participantes do curso EdPopSUS, das famílias e dos territórios de atuação de ACS, de ACE e de lideranças comunitárias, bem como das comunidades de pessoas quilombolas e assentadas, dos usuários e das usuárias dos serviços de saúde que ora se submetem aos atravessamentos macropolíticos, ora produzem agenciamentos coletivos do desejo de um território comum e resistem às condições de vida precária, à vida como resto, apostando na potência do pensamento e nas forças da vida, vida passível de luto e de luta.

3136 Reflexões sobre um currículo argiloso e o potencial da educação popular na formação de trabalhadores e movimentos sociais em defesa do SUS
Grasiele Nespoli, Irene Leonore Goldschmidt, Ronaldo Travasso, Julio Alberto Wong-Un, Marcelo Princeswal, Luanda de Oliveira Lima, Vera Joana Bornstein

Reflexões sobre um currículo argiloso e o potencial da educação popular na formação de trabalhadores e movimentos sociais em defesa do SUS

Autores: Grasiele Nespoli, Irene Leonore Goldschmidt, Ronaldo Travasso, Julio Alberto Wong-Un, Marcelo Princeswal, Luanda de Oliveira Lima, Vera Joana Bornstein

A institucionalização da Educação Popular, por meio da Política Nacional de Educação Popular em Saúde (PNEPS-SUS), consolida um processo de luta histórica dos movimentos de educação popular e evidencia sua importância no campo da saúde. A educação popular é reconhecida por se fundamentar em princípios e práticas contrários aos modelos hierarquizados, autoritários e norteados por uma perspectiva de educação elitista ou, como diria Paulo Freire, bancária. Foi no âmbito do Plano Diretor da PNEPS-SUS que teve origem o curso de Educação Popular em Saúde (EdpopSUS), primeiramente como um curso de sensibilização, promovido pelo Departamento de Apoio à Gestão Estratégica e Participativa da Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde (DAGEP/SGEP/MS) e coordenado pela Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), em parceria com a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), ambas unidades da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Essa fase foi desenvolvida de 2013 a 2014, ofertou dezenove mil vagas e envolveu nove unidades da federação: Bahia, Ceará, Distrito Federal, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo e Sergipe.A avaliação positiva da experiência do curso indicou a importância de sua continuidade. Em 2015, se iniciou a elaboração da segunda fase, agora como um curso de aperfeiçoamento com carga horária de 160 horas e sete mil vagas oferecidas em treze unidades da federação (Bahia, Ceará, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo e Sergipe). Como desde seu início o curso foi prioritariamente para agentes comunitários de saúde e agentes de vigilância em saúde, trabalhadores de nível médio, a coordenação da segunda fase passou para a EPSJV, instituição que tem se dedicado, dentre outros projetos, à formação técnica desses trabalhadores.A experiência de construção do EdpopSUS foi permeada por muitas inquietações, sendo que a mais importante diz respeito à contradição de se instituir um curso de educação popular num currículo nacional, uma vez que o método da educação popular parte sempre do diálogo, das experiências e da participação dos sujeitos, do inédito e do inusitado, da realidade que os cercam e os constituem. Nesse sentido, lançamos uma série de questões iniciais. É possível operar por essa contradição e construir uma unidade do processo educativo que considere a diversidade de sujeitos e realidades onde o curso acontece? É possível sugerir um caminho que dê abertura a novos arranjos e estratégias pedagógicas? Como traçar uma proposta que respeite a autonomia dos educadores e educandos, sem ferir as intencionalidades de um curso de educação popular? Enfim, como garantir que o caminho proposto não se torne rígido, cristalizado, autoritário, se contrapondo à educação popular?Para enfrentar essas questões, foram realizadas quatro oficinas nacionais com aproximadamente noventa participantes de instituições e movimentos implicados no curso. Após avaliação da primeira fase do EdpopSUS, teve início a construção curricular e do material educativo que iria servir como fio condutor da segunda fase. O coletivo envolvido na construção do EdpopSUS, coerente com os referenciais da educação popular, tomou o currículo como instrumento de ação política e pedagógica, como um plano de intencionalidades, princípios, estratégias e conteúdo dirigido à formação de trabalhadores e lideranças sociais.A principal intencionalidade, objetivo do Ministério da Saúde quando implementou o EdpopSUS, é o fortalecimento e a divulgação da PNEPS-SUS. Os princípios estavam definidos na própria política, o que, por sua vez, ia ao encontro dos princípios da educação popular: diálogo, problematização, amorosidade, construção compartilhada do conhecimento, participação democrática e popular. Nesse contexto, as estratégias político-pedagógicas deveriam preservar os princípios e os conteúdos garantir a discussão sobre direito, democracia, trabalho, cuidado, práticas educativas, território, história, dentre tantos outros temas levantados. Foram muitos os arranjos feitos até chegarmos numa proposta. Assumimos que a educação popular tem um acúmulo que permite traçar um currículo com certo grau de envergadura, pautado no diálogo e na participação democrática de educadores e educandos, organizado em eixos temáticos, encontros e atividades pedagógicas que tenha como ponto de partida as experiências dos participantes, e que possam compartilhar conteúdos considerados fundamentais para a formação dos trabalhadores e lideranças que atuam no campo da atenção básica, em especial, da estratégia saúde da família.Depois de muito debate, consolidamos seis eixos temáticos, organizados em encontros para serem mediados por dois educadores populares em cada turma, composta por até 35 educandos. Cada encontro tem seus objetivos definidos (de acordo com as intencionalidades dos eixos) e atividades propostas com base na experiência dos educandos e que integram à experiência reflexões críticas. Os eixos temáticos são: 1) A construção da gestão participativa e a experiência como fio condutor; 2) A educação popular no processo de trabalho em saúde; 3) O direito à saúde e a promoção da equidade; 4) Território, lugar de história e memória; 5) Participação social e participação popular no processo de democratização do Estado; 6) O território, o processo saúde-doença e as práticas de cuidado.Para expressar a proposta curricular, o material educativo foi composto por dois livros: 1) o Guia do curso, que apresenta os eixos temáticos, ordena os encontros e sugere atividades pedagógicas que visam promover um exercício de ação-reflexão-ação; 2) um compêndio de textos de apoio que organiza e disponibiliza o conteúdo abordado no curso. O material educativo foi pensado no sentido de favorecer um caminho comum para as diversas experiências vivenciadas, sem, no entanto, engessar o processo, visto que o fundamental é garantir a coerência com os princípios políticos-pedagógicos da educação popular que norteiam o Edpopsus.A experiência do EdpopSUS, analisada e sistematizada pela coordenação nacional, tem revelado que a riqueza da educação popular está na sua porosidade ao imprevisível, à experiência dos sujeitos e à realidade das diversas regiões, cidades e territórios onde o curso acontece. Observamos, pelos relatos e memória de educadores, nos seus diários de encontros (campo de registro inserido dentro do Sistema de Gestão Acadêmica do curso), e pelas cartas elaboradas pelos educandos (cartas de expectativas e de experiência - atividades propostas no curso), que o currículo do EdpopSUS é um chão de argila, moldado pelas mãos de um coletivo diverso, unido pela luta e defesa do direito à saúde.De modo geral, a trajetória formativa segue o plano inicial, mas muitos arranjos são feitos, atividades propostas, dinâmicas inseridas, textos substituídos, vídeos e outros recursos usados. A educação popular preza pela autonomia e participação dos sujeitos. Nos encontros não cabem prescrições, prevalecem os estranhamentos, os questionamentos e as problematizações. O reconhecimento dos saberes populares e das memórias, o incentivo à participação social e popular, a problematização do trabalho e a integração das práticas de cuidado, respeitando a diversidade cultural dos territórios e dimensões como a cultura, a arte e a espiritualidade, são temas/conteúdos que despertam e fortalecem atitudes e práticas de enfrentamento dos modos de exploração, opressão, discriminação, mercantilização da saúde e medicalização da vida.Por fim, vale dizer que o EdpopSUS é um projeto sensível a análise da conjuntura política e, nesse sentido, se constitui como uma importante estratégia que, pela formação, alcança milhares de trabalhadores e lideranças de movimentos sociais, alimentando uma perspectiva político-pedagógica contrária às iniciativas acirradas com o golpe político que instaurou uma onda conservadora e de retrocessos nas políticas públicas no país.

933 EDUCAÇÃO PERMANENTE NO CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL: UMA OPÇÃO POLÍTICO- PEDAGÓGICA EM CONSTRUÇÃO
Francisca Fatima Santos Freire, Annatália Meneses Amorim Gomes, Cosmo Hélder Ferreira da Silva, Vânia Barbosa Nascimento, Antonio Germane Alves Pinto, Ana Linhares Pinto, Francisca Bertilia Chaves Costa

EDUCAÇÃO PERMANENTE NO CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL: UMA OPÇÃO POLÍTICO- PEDAGÓGICA EM CONSTRUÇÃO

Autores: Francisca Fatima Santos Freire, Annatália Meneses Amorim Gomes, Cosmo Hélder Ferreira da Silva, Vânia Barbosa Nascimento, Antonio Germane Alves Pinto, Ana Linhares Pinto, Francisca Bertilia Chaves Costa

O presente trabalho é fruto da dissertação de mestrado intitulada “Educação Permanente no Centro de Atenção Psicossocial: Uma opção político- pedagógica em construção”. O cuidado em saúde mental, com foco na integralidade na atenção psicossocial, há algum tempo tem levado esta pesquisadora a profundas reflexões e inquietações, tornando-se motivação para o presente estudo. Defende-se que a EPS é uma poderosa estratégia para o desenvolvimento das ações de educação em saúde no âmbito do SUS. Pela experiência profissional no cotidiano do CAPS, identificou-se um espaço fecundo para a educação permanente, pois esta temática pouco era pensada ou considerada nos discursos dos trabalhadores e gestores. Objetivou-se analisar a EPS e sua relação com o desenvolvimento da integralidade do cuidado no Centro de Atenção Psicossocial, sob a perspectiva dos trabalhadores. Trata-se de uma pesquisa descritiva e analítica de abordagem qualitativa. O cenário eleito foi o CAPS de Crateús-CE. Portanto é necessário descrever-se algumas peculiaridades que caracterizam essa locorregião e determinam as relações sociais e econômicas e, consequentemente, as condições de saúde dos usuários do SUS. O município de Crateús está localizado no Centro-Oeste, trezentos e cinquenta e três quilômetros (353 km) da capital Cearense, com população de 74.271 habitantes. É uma cidade pólo que compõe a 15ª Célula Regional de Saúde (CRES), com população predominantemente rural e Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,644. É a décima terceira cidade mais populosa do estado do Ceará. O Centro de Atenção Psicossocial Dr. Abdoral Machado, está localizado à Rua Auton Aragão, S/N, bairro São Vicente, foi inaugurado em 1996 e reinaugurado com o perfil de ambiência, contemplado em 2011. Está inserido na modalidade CPAS I. O público alvo são os usuários da 15ª CRES, com média de 4.200 (Quatro mil e duzentos) usuários cadastrados e uma equipe multiprofissional para o atendimento, sendo referência para onze municípios. A coleta de dados foi realizada no período de Dezembro/2015 a Janeiro/ 2016. Optou-se pelo uso da entrevista semiestruturada. Os participantes da pesquisa foram os integrantes da equipe multiprofissional, totalizando 18 trabalhadores de saúde (profissionais de nível superior, médio e os residentes em Saúde Mental). Foram respeitados os princípios éticos recomendados pela resolução 466/ 12 do CONEP (Comissão Nacional de Ética na Pesquisa). Os dados obtidos foram analisados e interpretados utilizando-se o método de análise temática e categorização das falas. Todas as informações foram consolidadas mediante as atividades realizadas e registradas no diário de campo. Foram elaboradas as seguintes categorias: Concepções e ações de EPS no CAPS; Humanização e Integralidade do cuidado, redesenhando a história; e Os Desafios e possibilidades da EPS no CAPS. O presente estudo contou com a participação de 18 (dezoito) profissionais de saúde, sendo que 61,11% eram profissionais do sexo feminino e 38,89% do sexo masculino. A idade dos profissionais variou entre 25 a 56 anos, predominantemente adulta. Quanto à escolaridade, essa está associada à função que o profissional exerce na equipe do CAPS. Os dados apontam que 55,56% dos profissionais possuem nível superior, 44,44% representam o ensino médio, e salienta-se que, no período da coleta dos dados, alguns profissionais expuseram que estavam ingressando em cursos de nível superior. Indagou-se sobre o tempo de atuação na instituição e encontrou-se o seguinte: 40% estão na instituição há mais de 03 anos, 20% entre 04 a 05 anos e 10% há mais de 05 anos. Quanto à qualificação profissional para suporte na atuação no cenário da atenção psicossocial, conforme os dados encontrados, apenas 3% dos profissionais sinalizaram participação em curso introdutório para atuação na Atenção Psicossocial e 97% relataram que não conheciam a rotina do CAPS, pois pertenciam a outros serviços de saúde e, por necessidades administrativas, foram lotados no CAPS. Em relação à Educação Permanente na Atenção Psicossocial no município de Crateús, considera-se com base nos achados dessa pesquisa que essa se iniciou em 2010, conforme o Plano Municipal de Saúde; porém, os registros nos livros de ata e arquivos datam de 03/2011, quando aconteceu o primeiro fórum sobre a temática no Centro de Atenção Psicossocial.  Buscou-se elucidar das falas, os sentimentos, vivências e experiências construídas no cenário dos trabalhadores sobre as concepções e ações de educação permanente no CAPS, evidenciando a necessidade de maiores investimentos na área. Observou-se que a EPS está se desenhando pela vertente política e crítica dos profissionais e houve convergência entre os participantes do estudo, que consideraram ser educação permanente uma política importante, que promove a reflexão crítica, ao mesmo tempo em que divergiram de sua aplicação, ao se referirem às práticas continuadas na residência multiprofissional em saúde coletiva, ensejando que a saúde mental “precisa sair do papel”. Quanto às ações de educação permanente no CAPS, a participação dos trabalhadores na análise dos processos de trabalho, de acordo com a proposta do quadrilátero da EPS, é avaliada pelos participantes de forma divergente desde a periodicidade dos eventos de educação permanente e a relevância dos temas abordados para a aplicação no cenário profissional. Sabe-se que a Educação Permanente em Saúde já acontece na instituição; porém, a equipe precisa apoderar-se da grandeza dessa estratégia, como instrumento de fortalecimento do trabalhador e mobilização para a efetivação da Política Nacional de Humanização. Urge que a compreensão da política da EPS seja prioridade no plano de governo municipal, pois essa é poderosa estratégia para a melhoria do serviço e da qualidade da atenção e, para tanto, precisa-se tanto do planejamento articulado pela equipe como do seu protagonismo. Dos dados colhidos e apreciados, identificam-se o entusiasmo, carinho e otimismo pela saúde mental. A subjetividade é exaurida através de suas falas, não negando o sentimento de impotência e angústia pelos desafios experimentados no cotidiano e das limitações da rede de assistência em saúde mental. Portanto, as falas indicam que a Política de Educação Permanente em Saúde (EPS) tem elementos para aprimorar o processo de trabalho, uma vez que a formação sugerida parte das necessidades sentidas pelos sujeitos. Assim, partindo das considerações teóricas expressas e com o propósito de explicitar o pressuposto que motivou a pesquisa, evidencia-se a ressignificação das práticas da EPS no CAPS de Crateús, produzindo novos conceitos e ações e exercendo, assim, o papel político e pedagógico em construção.

1243 Representações Sociais de Estudantes de Medicina a partir das mudanças na formação introduzidas pelo Programa Mais Médicos
Felipe Proenço de Oliveira, Leonor Maria Pacheco Santos

Representações Sociais de Estudantes de Medicina a partir das mudanças na formação introduzidas pelo Programa Mais Médicos

Autores: Felipe Proenço de Oliveira, Leonor Maria Pacheco Santos

Introdução São recorrentes as análises e relatos de que a formação médica não está voltada para as necessidades sociais e, portanto não consegue corresponder ao que é preconizado para o Sistema Único de Saúde (SUS). Ao observar a atitude do estudante de medicina no Brasil, Feuerwerker critica o modelo pedagógico da graduação e as dificuldades de estabelecer atividades práticas que reflitam a realidade do sistema de saúde, descrevendo que “quase ninguém examina, nem conversa, nem se responsabiliza pelos pacientes, esse é o modelo de prática que tem sido oferecido aos estudantes”. A necessidade de mudanças na formação em saúde no Brasil foi motivação para uma série de ações governamentais nos últimos anos. A iniciativa de maior abrangência nessa área, contemplando aspectos regulatórios e normativos, foi o Programa Mais Médicos (PMM). Para a mudança da formação médica o PMM propôs reordenar a oferta de cursos de medicina e de vagas de residência médica; estabelecer novos parâmetros para a formação médica no Brasil; e promover aperfeiçoamento de médicos na área da atenção básica através de iniciativas de integração ensino-serviço. Como reflexo dessa orientação foram publicadas novas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para os cursos de medicina. As novas DCN tem como principal eixo a aproximação do processo de formação com as necessidades de saúde da população e ao modo de organização do SUS. Tradicionalmente, Instituições de Ensino Superior não compatibilizavam os currículos acadêmicos com as DCN, comprometendo a inserção de novos profissionais no sistema público de saúde. Somente a partir da promulgação da Lei do Mais Médicos a adoção das DCN tornou-se obrigatória. Busca-se neste trabalho analisar como os estudantes de medicina estão percebendo essas modificações e compreendendo a importância na sua formação (vislumbrando a futura prática profissional) da temática sobre o trabalho na atenção básica. Para tanto interessou estudar as representações sociais dos estudantes de medicina, em cursos “tradicionais” que formam médicos há décadas e cursos “novos” criados em iniciativas potencializadas pelo PMM.   Desenvolvimento Trata-se de um estudo exploratório de metodologia qualitativa, na busca de  compreender o significado e a intencionalidade de forma inerente aos atos, às relações e às estruturas sociais. Desse modo, trabalhou-se um universo de significados, aspirações, sentimentos, crenças e valores. Trabalhou-se, portanto, com a compreensão das representações sociais dos estudantes de medicina em determinadas IFES da Região Nordeste. As representações sociais são elementos simbólicos que os homens expressam mediante o uso das palavras e gestos. Também podem ser definidas como mensagens mediadas pela linguagem, construídas socialmente e, necessariamente, ancoradas no âmbito do contexto do indivíduo que as emite. Enquanto se cria a representação de um objeto, também o sujeito se constitui. Quando o sujeito expressa uma opinião sobre um objeto, supõe-se a contribuição para a elaboração de uma representação. Com vistas a exequibilidade da  pesquisa, foram estudados quatro cursos de medicina de IFES da Região Nordeste, sendo dois criados antes da década de 60 (grupo “tradicional”) e dois criados no ano de 2014 (grupo “novo”). Foram convidados a participar da pesquisa todos os estudantes do sétimo semestre desses cursos entre os meses de julho e setembro de 2017. Entre os 198 estudantes matriculados no sétimo semestre desses cursos, 159 compareceram na aula no dia da aplicação do instrumento, dos quais 149 aceitaram participar voluntariamente do estudo, sendo 68 dos cursos “tradicionais” e 81 dos cursos “novos”. Em um primeiro momento os participantes responderam um questionário sociodemográfico, baseado em perguntas do ENADE. No segundo momento preencheram um roteiro de evocação livre, onde citavam três palavras que lhe ocorressem imediatamente em relação ao termo “trabalho em atenção básica”. Em seguida, os estudantes enumeraram em ordem de importância as palavras ou expressões escritas para a hierarquização dos itens. O perfil dos participantes foi analisado em Excel e as palavras citadas no roteiro de evocação livre foram analisadas com o auxílio do software Iramuteq. A pesquisa foi aprovada em Comitê de Ética em Pesquisa.   Resultados Em ambos os grupos, ou seja, tanto no núcleo central dos estudantes dos cursos “tradicionais” como dos cursos “novos”, o termo mais destacado é a prevenção, o que indica o reconhecimento, por parte dos estudantes, da atenção básica como o lócus para essa forma de cuidado. Em estudo realizado nacionalmente no âmbito da Saúde da Família, constatou-se que a maior parte dos profissionais refere desenvolver atividades de prevenção, mas principalmente entre os médicos foi baixa a proporção de quem realizou, o que evidencia a distância entre o que é preconizado e o que é desenvolvido na atenção básica. Além disso, esse resultado sugere a incorporação ao longo da graduação de uma visão baseada no modelo médico-privatista que não considera a capacidade de resolução da atenção básica. Esse olhar tende a ser reforçado ao longo do curso de medicina em que há uma fragmentação da formação pelo olhar das especialidades Considerando o núcleo central, destaca-se no grupo de escolas “novas” a presença de termos como “vínculo” e “responsabilidade”. Sugere-se que exercitar o vínculo e a responsabilidade seja mais viável em currículos que propiciam um contato maior e mais frequente do estudante com a atenção básica. Muitas vezes nos currículos tradicionais o estudante tem contatos pontuais com as pessoas em que participa do atendimento e geralmente não consegue observar o desfecho das ações propostas para o usuário em virtude da rotina de troca de estágios. Diferentemente de currículos tradicionais, nos currículos novos os estudantes participam do cuidado ao longo do tempo de pessoas e famílias, se co-responsabilizando pelo seu acompanhamento pelo período mínimo de um semestre. Desse modo podem vivenciar intensamente a responsabilização pelas pessoas e elaborar uma representação mais significativa sobre esse tema. É nesse contexto inclusive que pressupõe-se que a inserção dos estudantes nas equipes de saúde da família pode melhorar a qualidade da assistência a saúde das pessoas do território onde estão. Ademais, na análise da primeira periferia dos cursos “novos” aparecem os termos “comunidade” e “cuidado”. A maior vivência na atenção básica possibilitada pelos currículos “novos” parece ser decisiva para as representações sociais dos estudantes. O cuidado pode ser visto sob a perspectiva emancipatória, explicitando as relações de poder existentes no processo de trabalho em saúde e contribuindo, portanto, para a autonomia das pessoas que procuram os serviços de saúde. Essa perspectiva está em consonância com as competências da dimensão de atenção à saúde dispostas nas DCN de 2014 onde valoriza-se não só os desejos e interesses dos usuários do SUS bem como se estimula a autonomia intelectual do educando.   Conclusão A política regulatória disposta na Lei 12.871 pode trazer novas perspectivas para a formação médica, pelo menos no âmbito das representações sociais sobre o trabalho na atenção básica. Faz-se necessário observar como essas experiências se comportarão nos mecanismos de avaliação, de âmbito institucional ou processual, propostos no Mais Médicos, para que sejam possíveis novas conclusões sobre o tema. Espera-se que exemplos como os analisados aqui, que apontam o potencial das escolas novas estimularem representações sociais dos estudantes de medicina mais próximas das necessidades do sistema de saúde, possam ser multiplicados e aprofundados na radicalidade necessária para o fortalecimento do SUS. Mesmo em um contexto de retrocessos, fica a percepção de que é possível transformar a formação médica.